“Chalita perde ação por danos morais contra ex-assessor
O deputado federal Gabriel Chalita (PMDB-SP) perdeu ação judicial contra o analista de sistemas Roberto Grobman, que o acusa de enriquecimento ilícito e de ter recebido propina quando ocupava a secretaria estadual da Educação no governo de Geraldo Alckmin (PSDB), entre 2003 e 2006.
Chalita pedia indenização de R$ 135 mil porque considera que Grobman praticara os crimes de calúnia, injúria e difamação aos fazer as acusações contra ele a promotores paulistas (...)
O juiz Carlos Aleksander Goldman decidiu que Grobman não cometeu crime porque não houve má-fé por parte do acusador e porque há indícios sobre as supostas irregularidades.
Goldman citou decisão do ex-ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Edson Vidigal para justificar a sua posição: ‘A imputação de fato criminoso a alguém, embora feita precipitadamente, não configura o crime de calúnia, se fundada em razoável suspeita. Nesse caso, o ânimo que move o agente não é o propósito deliberado de enxovalhar a honra de ninguém, mas apenas a vontade de encontrar a verdade’.
De acordo com o juiz, há entendimento de longo prazo nos tribunais segundo o qual as acusações contra políticos não constituem calúnia quando não são movidas por má-fé ou com a intenção deliberada de prejudicá-los”.
Quando você diz ao Ministério Público, polícia ou mesmo do Judiciário que alguém cometeu um delito que você sabe que ele não cometeu, você não está necessariamente cometendo calúnia, difamação ou injúria. O crime que você certamente está cometendo é o de denunciação caluniosa.
Embora com nomes parecidos, calúnia e denunciação caluniosa são crimes muito diferentes. O primeiro é um crime contra a honra da vítima e cujo o processo é movido pelo ofendido (ou seu representante legal). Já a denunciação caluniosa é um crime contra a administração da Justiça e cujo o processo é movido pelo Ministério Público.
Uma diferença ainda mais fundamental é que a calúnia é punível porque o delinquente ofende a honra da vítima, enquanto a denunciação caluniosa é punida porque o criminoso faz com que o aparato estatal perca tempo e recursos investigando alguém por um crime que não ocorreu ou do qual ele é inocente. Ela cria uma distração que beneficia os verdadeiros criminosos que deveriam estar sendo realmente investigados.
A denunciação caluniosa pode ocorrer mesmo que o investigado sequer saiba que o criminoso disse à polícia ou MP que ele era culpado de um crime. A vítima é o Estado/sociedade, e não o investigado.
Mas então por que na matéria acima o deputado estava processando por calúnia quem levou o caso ao conhecimento do MP?
Porque, com o mesmo ato, alguém pode estar cometendo dois crimes: calúnia e denunciação caluniosa. Ao dizer falsamente ao MP que Fulano cometeu um crime sabendo que ele é inocente, a pessoa está cometendo uma denunciação caluniosa, mas – e como normalmente acontece – se essa informação chegar a Fulano e ele sentir-se ofendido, quem levou a informação ao MP também terá cometido calúnia. Daí o deputado na matéria acima ter se sentido caluniado.
Mas, como o magistrado na matéria acima lembrou, simplesmente levar um fato ofensivo ao conhecimento da polícia, MP ou Judiciário não é, por si só, uma calúnia ou denunciação caluniosa. Mesmo que esse fato não seja verdadeiro.
No caso da calúnia, é importante que quem disse tenha agido de má-fé.
Esse critério da má-fé é importante porque ao dizer algo negativo em relação a alguém estamos sempre assumindo um certo risco de ofender tal pessoa. Políticos são particularmente sensíveis porque, afinal, vivem da percepção pública. Qualquer coisa que possa prejudicar suas carreiras é visto como negativo, ofensivo.
Isso tornaria a vida de potenciais testemunhas impossível. Mas não apenas potenciais testemunhas, mas também de jornalistas reportando potenciais crimes. Daí a razão de o magistrado ter de estar convencido de que quem disse ter agido com má-fé.
Logo, não basta simplesmente que a vítima se sinta ofendida e quem disse tenha desejado ou assumido o risco de ofendê-la: é preciso mostrar que quem falou estava predisposto a usar o que disse para ofender e não apenas para informar.