“Servidores usam lancha destinada à fiscalização para passear na Bahia
Servidores federais foram flagrados usando uma lancha do governo, que deveria servir para fiscalizar a costa brasileira, durante um passeio de família no último domingo (27) no arquipélago dos Abrolhos, no sul da Bahia (...)
Órgão federal responsável pela fiscalização, o instituto confirmou a presença de servidores na embarcação, mas negou que estivessem num passeio. Procurado, o Ministério da Pesca, que cedeu a lancha, disse que pedirá esclarecimentos ao ICMBio (...)
A lancha é a única embarcação disponível para fiscalizar a pesca ilegal em mais de 380 mil hectares. Sua cobertura inclui o Parque Nacional Marinho dos Abrolhos.
Coordenador do ICMBio em Porto Seguro, Apoena Figueirôa disse que as fotos mostram o coordenador regional substituto do órgão, Amarílio Fernandes, um filho e a mulher dele, funcionária do Ibama, e dois terceirizados. Disse que ele também estava no grupo, junto com a mulher, servidora do ICMBio”.
Diz nosso Código Penal que o servidor público que se apropria de um bem público está cometendo o crime de peculato, que é uma espécie de combinação dos crimes de furto e apropriação indébita, mas cometida pelo servidor público em relação aos bens públicos ou particulares.
A lei diz que é peculato apropriar-se ou subtrair o bem. E, segundo a interpretação de nossos tribunais e juristas, isso significa ter a intenção de não retornar o bem ao seu legítimo dono.
É o mesmo que ocorre com o furto: a pessoa que subtrai o bem alheio com a intenção de retorná-lo mais tarde não está cometendo furto. É o que os juristas chamam de furto de uso, que não é crime pela lei brasileira.
O mesmo ocorre com o chamado peculato de uso: o servidor público que usa o carro da repartição para levar o filho à escola ou o laptop para jogar paciência em casa não está cometendo peculato se ele não tem a intenção de ficar com o carro ou o computador de forma permanente.
Mas há um detalhe importante: quando o bem é fungível, há peculato, ainda que o servidor tivesse intenção de devolvê-lo mais adiante. Fungível é aquilo que pode ser trocado por outra coisa idêntica. Laranjas são fungíveis porque são idênticas.
Pois bem, dinheiro é algo fungível. Se um servidor se apropria de uma pilha de dinheiro do cofre da repartição na qual trabalha para pagar suas contas, mas com a intenção de depois repor aquele dinheiro à repartição pública, ele está cometendo peculato, ainda que não tivesse a intenção de ficar com aquele dinheiro para si de forma permanente.
A ideia é que ele não tinha a intenção de devolver aquilo que subtraiu, mas devolver algo idêntico ao que havia subtraído. Ou seja, não houve peculato de uso, mas peculato.
Um veículo, como a lancha da reportagem acima, é infungível e, por isso, não há peculato se o servidor tinha a intenção de devolver o veículo ao dono.
Mas o servidor que usa uma embarcação ou um carro ou um helicóptero para fins pessoais, pode ser enquadrado de duas outras formas:
O veículo é infungível, mas o combustível não é. Logo, há peculato em relação ao combustível já que é impossível devolver exatamente a mesma gasolina que foi usada (aliás, o mesmo ocorre no furto de uso).
E quem usa ou facilita o uso pode estar cometendo improbidade administrativa.