“A polícia em Ilha Solteira (660 km de SP) indiciou sob suspeita de sequestro e cárcere privado a mestranda em odontologia pela Unesp (Universidade Estadual Paulista) Rosângela Conceição Mioti de Souza, 33.
Rosângela foi presa ontem na casa do professor Elerson Jardim Júnior, seu co-orientador de mestrado. Segundo a polícia, ela invadiu a casa e fez uma empregada refém com uma arma do marido, policial aposentado. Jardim estava ausente durante a invasão anteontem.
Pela investigação, Rosângela queria matar Jardim e depois se suicidar. No sequestro, ela o acusava de abuso sexual e chantagens.
Em janeiro, ela havia denunciado Jardim para a polícia. O marido, José Aguiar, diz que ela foi obrigada a fazer sexo com Jardim para que não fossem mostradas fotos sensuais de um pen drive emprestado ao professor. A Folha não conseguiu falar com Rosângela e seu advogado.”
Ontem falamos do roubo e extorsão e como a grave ameaça faz parte daqueles crimes. Hoje vamos falar da ameaça no crime de estupro e como um crime independente.
Nosso Código Penal diz em seu artigo 147 que é crime “ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave”. Esse crime chama-se ameaça. Reparem que esse artigo não está dizendo que o crime é cometido com um propósito específico.
Ontem, quando falamos do roubo e da extorsão, a ameaça servia para ajudar na subtração do bem da vítima. No crime de ameaça, ao contrário, não há um propósito além de causar temor na vítima. Nele, o criminoso não ameaça para conseguir algo. Ele ameaça apenas por ameaçar.
Se Fulano ameaça Cicrana de divulgar as fotos sensuais dela que encontrou por acaso, ele está cometendo o crime de ameaça.
Mas, a partir do momento em que ele faz essa ameaça com o intuito de obter sexo, passa a ser um outro crime: estupro. Ao contrário do que muita gente pensa, para que o estupro ocorra não é necessário que haja a violência (bater em alguém, ser agarrada etc). Basta que haja a ameaça. E como o exemplo da matéria acima evidencia, há milhares de formas de alguém ser ameaçado gravemente sem que haja violência envolvida. Em teoria, até o marido que ameaça a esposa de abandoná-la para forçá-la a fazer sexo com ele, também está cometendo estupro. Desde que a ameaça seja grave - e isso será o magistrado quem decidirá - haverá o estupro.
Então a pessoa da matéria acima cometeu dois crimes? Violência e ameaça? Não. Reparem que o artigo 213 de nosso Código Penal diz que estupro é “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso”. Notem que a ameaça (ou a violência) faz(em) parte do crime de estupro. Não é possível praticar estupro sem que haja ou violência ou grave ameaça. São o que os juristas chamam de ‘elementos essenciais do crime’. Nesses casos, pelo princípio da absorção, do qual já falamos aqui, o crime menor (ameaça) faz parte do crime maior (estupro), logo a pessoa responderá apenas pelo crime maior.