“Grampos são ilegais, diz defesa de empresário
A defesa de Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, não respondeu aos questionamentos da Folha.
Nas últimas semanas, a defesa diz que não fará comentários sobre gravações pontuais. Na defesa entregue à Justiça, os advogados sustentam a ilegalidade dos áudios.”
Quando um advogado de defesa precisa defender seu réu ele pode focar em quarto áreas distintas, ou em qualquer combinação de duas ou mais delas:
Primeiro, ele pode focar nos fatos e dizer que eles não existem ou não são como os alegados pela acusação. Se Huguinho é acusado de matar Zezinho, ele alega que estava em outro país no dia do crime ou que o exame residual de pólvora não encontrou nenhum indício de que ele usou uma arma no dia do crime.
Segundo, ele pode focar na lei e dizer que aquela lei não existe ou que outra lei a invalidou etc. Por exemplo, se Huguinho é acusado de praticar o furto de uso, o advogado pode alegar que furto de uso não é crime no Brasil.
Terceiro, ele pode focar na aplicação das leis aos fatos. Ele pode dizer que os fatos ocorreram e que a lei existe, mas que a lei não é aplicável àqueles fatos, ou está sendo incorretamente aplicada, ou que é outra a lei aplicável àqueles fatos. Por exemplo, se Huguinho é acusado de atear fogo e matar Zezinho enquanto ele dormia no ponto de ônibus, a defesa pode dizer que não houve homicídio, mas sim uma lesão corporal seguida de morte (cuja pena é menor, e que é julgada por um juiz togado e não por jurados).
Por último, a defesa pode alegar que as provas são falsas ou que foram colhidas ilegalmente, como no caso da matéria acima. Aqui ela não está dizendo que os fatos não ocorreram ou que o suspeito não errou ou que a lei não se aplica a ele. O que ela está fazendo é dizer que, ainda que tudo isso seja verdade, a forma como a acusação escolheu de atacar é ilegal.
Podemos pensar nesses tipos de defesa como muros ao redor de uma fortaleza ou fases de um jogo de vídeo game: cada um oferece mais proteção do que o outro, e os bons juristas tendem a usar todos eles (da mesma forma como uma boa fortaleza tem vários muros ao seu redor), embora saiba que um deles é o que oferece mais possibilidades de resistência. Ou seja, se o inimigo (acusação) conseguir passar por esse muro, o rei provavelmente será capturado.
Qual dos tipos de defesa apresentará a melhor defesa vai variar em cada caso.
Como bons castelos, uma boa defesa é composta não de muros concêntricos, mas de muros interlaçados, que formam uma espécie de um labirinto que oferece não só proteção, mas também a possibilidade de surpreender ou mesmo contra-atacar o inimigo. Dependendo de que lado do castelo o inimigo decide atacar, os muros que enfrenta mudam. E porque os muros estão entrelaçados, o inimigo às vezes tem até mesmo que cruzar o mesmo muro mais de uma vez em pontos diferentes.
Por exemplo, a acusação pode ser obrigada a provar que tal lei é aplicável a tal fato mais de uma vez, já que os fatos são incertos ou podem ser interpretados de formas diferentes.
Além disso, uma boa defesa também cria ‘torres’ de onde pode atacar o inimigo. O objetivo do inimigo não é a torre e ele sequer precisa passar pela torre para chegar ao rei/réu, mas as torres existem para distrair o inimigo e tornar sua vida mais difícil, obrigando-o a gastar recursos que poderiam ser gastos em outros frontes. É por isso, por exemplo, que às vezes vemos a defesa incluir pareceres enormes que tem pouca relevância ou pedindo a produção de centenas de novas provas ou que se ouçam testemunhas pouco relevantes. Para cada uma dessas torres, a acusação precisa perder tempo lendo, ouvindo, analisando e investigando. Tempo e energia que poderiam ser gastos no ataque ao objetivo principal. Pense em um castelo sitiado: se o inimigo tem de passar meses procurando uma brecha, em algum momento ele receberá ordem de desistir do ataque ou perceberá que o custo daquele ataque não vale a pena.
Voltando à matéria acima, o problema em alegar apenas que determinada prova é ilegal é que ela, na verdade, não é um muro de defesa. Ela é simplesmente uma alegação de que o uso de determinada arma vai contra as regras do jogo ou da guerra. Se o uso de tal arma for considerado legal, não há nenhum muro para proteger o rei.