“No Judiciário, 84,5% dos juízes se dizem brancos e 1,4% pretos, diz CNJ
Dados de um Censo realizado pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) revela que 84,5% dos juízes do Brasil se consideram brancos, 14% se dizem pardos, 1,4% pretos e 0,1% indígenas.
Os números foram revelados na sessão do CNJ desta segunda-feira (16) e serão usados para subsidiar o debate sobre a necessidade de se implementar uma política de cotas para o ingresso na magistratura.
Ao todos, foram ouvidos 10,7 mil dos 16,8 mil magistrados em atividade no país. A pesquisa foi realizada entre os dias 4 de novembro e 20 de dezembro de 2013.
Além do indicativo racial, o Censo do Judiciário também revelou que 64% dos magistrados são do sexo masculino. Os homens ainda ocupam 82% das vagas dos tribunais superiores.”
O aforisma é de que a Justiça é cega. A realidade é que ela é composta de seres humanos que trazem consigo suas culturas, histórias vida, valores pessoais e sociais e, infelizmente, preconceitos. Às vezes, raciais e sexuais.
Se os preconceitos acabam se refletindo em seus julgamentos ou não, é um debate infindável. Mas certamente a visão de mundo do magistrado se reflete em seus julgamentos.
Ademais, a própria lei dá ao magistrado margem para aplicar a lei de acordo com seu grau de convencimento, que também é algo subjetivo e, por conseguinte, que reflete sua visão de mundo.
Um homicídio simples, por exemplo, é apenado com pena que varia entre 6 e 20 anos. Se a pena base será de 6, 7, 13 ou 20 anos, será o magistrado quem decidirá. A lei apenas estabelece os limites.
Óbvio que se simplesmente criarmos cotas para negros, pardos, mulheres etc, estaremos correndo o risco de desvirtuar a meritocracia pura, baseada apenas na capacidade técnica do magistrado, pois algumas pessoas serão selecionadas não porque tiveram as melhores notas dentre todos os candidatos, mas porque tiveram notas melhores do que os demais candidatos de sua cor, raça, sexo ou qualquer outro critério de cotas aplicado, ainda que tenham tido um desempenho inferior aos dos candidatos de outra cor, raça ou sexo que não foram aprovados.
Além disso, é importante lembrar também que cotas por raça ou cor apenas remedia indiretamente o problema educacional. O candidato negro e o candidato branco que frequentaram a mesma instituição de ensino serão tratados de formas diferentes, ainda que tenham tido acesso a ensino da mesma qualidade.
Logo, a possibilidade de piorarmos a qualidade técnica dos julgamentos existe e temos de levar isso em conta no debate das cotas.
Mas ao mesmo tempo não podemos nos esquecer que Justiça não é apenas a letra da lei. É a aplicação da lei em um contexto social e cultural, e uma Justiça de brancos não reflete a diversidade social e cultural da sociedade.
O contexto social e cultural pode ser até mais importante que a análise técnica. Basta lembrar que nos crimes contra a vida – como o homicídio ou o infanticídio – os jurados, que são pessoas que não entendem nada de direito ou lei, mas que refletem a diversidade social e cultural da sociedade, é quem julgam o acusado e a decisão deles prevalece sobre a do juiz de direito. Se os jurados decidem absolver alguém que o juiz de direito está convencido ser culpado, ou vice-versa, será a decisão dos jurados que prevalecerá, justamente porque são eles que refletem a sociedade.
Daí cabe perguntar: se a lei diz que nos crimes graves como o homicídio é mais importante considerarmos a decisão de quem representa a sociedade do que a do técnico formado em direito e aprovado em concurso, por que não nas questões menores? Ou o critério é o grau de dificuldade técnica da questão? Afinal, todos sabemos o que é matar alguém, mas nem todos sabemos como lidar com a insolvência de um banco de investimento com bilhões de ativos securitizados. Não seria então o caso de termos concursos para magistrados de causas mais técnicas (sem cotas) e causas menos técnicas (com cotas)?
Mas se a ideia é representar a visão da sociedade, por que concurso? Não seria mais fácil e eficiente simplesmente escolhermos magistrados leigos baseados em critérios sociais, demográficos ou que estejam vinculados ao grupo social que queremos ver representados na Justiça?
Por fim, vale lembrar que em vários países desenvolvidos, juízes de direito julgam acompanhados de representantes da sociedade em vários assuntos.