“Maluf é autorizado pelo STF a ir para os EUA, mas desiste
Apesar de estar na lista de procurados pela Interpol (polícia internacional com 190 países-membros), o deputado federal Paulo Maluf (PP-SP) conseguiu autorização do STF (Supremo Tribunal Federal) para viajar ao exterior.
O pedido foi feito na semana passada, acompanhado de autorização da Câmara dos Deputados, e aceito pelo ministro Ricardo Lewandowski.
Anteontem à noite, porém, a defesa do deputado federal informou ao STF que ele havia desistido da viagem.
O objetivo da ida de Maluf ao exterior seria representar a Câmara em um evento da ONU (Organização das Nações Unidas) neste mês.”
Ele pode viajar mas será preso ao desembarcar nos EUA, porque ele é procurado pela Justiça norte-americana. Por isso desistiu de sair do Brasil.
Membros do corpo diplomático, chefes de Estado e chefes de governo, quando vão à ONU (cujo edifício-sede está localizado em Nova York) não podem ser detidos.
É essa mesma proteção diplomática que permite chefes de Estado inimigos declarados dos EUA fazerem discursos anti-EUA na ONU, em plena Nova York, como o caso de Muammar Gaddafi em 2009. A ONU está nos EUA, mas ela não pertence aos EUA. Como parte do ‘pacote’ de negociações entre os governos quando foram decidir onde instalar o prédio-sede da ONU, os EUA tiveram que que aceitar que mesmo representantes de países com os quais não possuem boas relações – Irã, Coreia do Norte ou Cuba, por exemplo – pudessem trabalhar (temporária ou permanentemente) em Nova York (na verdade, na ONU) ou visitar o país para encontros na ONU.
Mas parlamentares não estão sob a mesma proteção. Se um parlamentar resolve visitar os EUA, por qualquer motivo que seja, ele estará sujeito às leis americanas. Se ele é procurado pela Justiça dos EUA, pode ser preso. Não interessa que a Justiça de seu país o autorize a estar em liberdade. Nos EUA valem as leis norte-americanas, assim como no Brasil valem as leis brasileiras. Independente da nacionalidade da pessoa.
Mas e se ele resolver, por exemplo, visitar algum país da União Europeia?
Ele também poderá ser preso. Note na foto acima que ele não é procurado pela Justiça brasileira (ela sabe perfeitamente bem onde ele está): o pedido foi feito pela Justiça americana.
Os EUA – e não o Brasil – pediram sua inclusão na base de dados de procurados da Interpol, que nada mais é do que um sistema de coordenação e cooperação entre as polícias de vários países. Logo, ele pode ser preso em um terceiro país a pedido dos EUA.
É justamente esse sistema, por exemplo, que permitiu a prisão do banqueiro ítalo-brasileiro Salvatore Cacciola, quando ele visitou o principado de Mônaco. Ele era procurado pela Justiça brasileira mas conseguiu fugir do território brasileiro. Como o principado faz parte da Interpol e a Polícia Federal brasileira pediu sua prisão aos demais países-membros, ele foi preso ao chegar em Mônaco.
Os casos do deputado citado na matéria e do banqueiro têm mais um detalhe em comum: antes de serem presos pela polícia do país hospedeiro, eles estavam em países dos quais são nacionais. O parlamentar, no Brasil; o banqueiro, na Itália.
Como regra geral, países não extraditam seus nacionais. Logo, embora a Itália soubesse que o banqueiro era procurado no Brasil, e o Brasil saiba que o parlamentar é procurado nos EUA, não foi possível fazer a extradição da Itália para o Brasil (no caso do banqueiro) ou do Brasil para os EUA (no caso do deputado). O Brasil não pode extraditar um procurado brasileiro, assim como a Itália não podia extraditar um procurado italiano (não interessa que ele também tivesse a nacionalidade brasileira: para a Itália ele é italiano).
Se o deputado sair do Brasil e for para qualquer país membro da Interpol, ele poderá ser preso até que a Justiça local decida se aceita ou não o pedido de extradição que a Justiça americana apresentará.
Foi isso que aconteceu com o banqueiro. Ele saiu da Itália (de onde ele não podia ser extraditado, já que é italiano) e foi a Mônaco. Como ele não é um súdito do principado e ele era procurado pela Interpol, a polícia local o prendeu e o manteve preso até que a Justiça decidisse o pedido de extradição apresentado pelo Brasil (na verdade, o principado tem um acordo com a França através do qual foi a Justiça francesa quem julgou o pedido brasileiro).
PS: Ponha-se no lugar de magistrados que queiram ver o parlamentar preso mas que têm suas mãos amarradas por leis feitas pelo mesmo parlamento do qual o procurado é membro? Autorizar o parlamentar a viajar sabendo que ele será preso pelo país de destino pode ser uma forma de conseguir, de alguma forma, finalmente prendê-lo.