"A patente e suas vítimas
Foi a 'Texas Instrument' que, no início da década de 80, percebeu o maná que poderia ser a legislação patentária. Formou legião de advogados especializados em litígio, depositou uma imensidão de pedidos de patentes e logo viu suas receitas provenientes de litígios devidos à propriedade intelectual suplantarem aquelas relativas à produção.
O exemplo foi logo seguido por uma coorte de empresas, e viu-se a proliferação de advogados de patentes, firmas e consultorias. Quanto mais aplicações de patentes, mais litígio, mais legislação e, consequentemente, mais advogados, mais parasitas, constituindo um círculo vicioso cuja única consequência é o retardamento do desenvolvimento tecnológico.
Para setores em que intensivas pesquisas predominam, o benefício proporcionado pela introdução da inovação no mercado é suficiente como retribuição pelos investimentos em pesquisas e eventuais mudanças de processos de produção que possam ter exigido investimentos expressivos."
As indústrias dos países avançados gastam bilhões de dólares em pesquisas para desenvolver novos produtos. Quando fazem uma descoberta de sucesso protegem seu investimento com uma patente que lhes dá, em princípio, o direito exclusivo de comercializá-lo, no país de origem e no mundo por pelo menos 20 anos
Essa pode parecer uma discussão que só interessa às empresas e está longe de nosso cotidiano. Mas essa proteção legal encarece substancialmente medicamentos que chegam ao mercado por preços muitas vezes proibitivos para pessoas com menos recursos (por conta disso, nos últimos anos algumas leis e acordos têm permitido que países obriguem as empresas a compartilharem esses direitos com as concorrentes em diversas circunstâncias).
Em algumas áreas como a saúde, além de patentear os compostos químicos, certos medicamentos são cobertos ainda por marcas, cuja proteção é ilimitada no tempo. As marcas são os nomes pelos quais os medicamentos feitos a partir daqueles compostos químicos são conhecidos pelo público.
Por outro lado, as empresas alegam que, sem a proteção das patentes e dos consequentes lucros, não teriam como cobrir os custos de pesquisa (alguns compostos químicos precisam de mais de uma década de investimento para serem desenvolvidos) e os riscos de implementação. Governos de países em desenvolvimento e ONGs, por outro lado, dizem que a saúde, por exemplo, é um bem público que deve ser barateada ao máximo.
Esse problema é maior do que parece e é uma fonte constante de tensão entre os países. Em maio desse ano o Anti-Counterfeiting Trade Agreement (ACTA), um acordo internacional que basicamente ‘exporta’ as leis dos EUA contra pirataria para outros países, foi aberto para a assinatura, e até agora 8 países já o assinaram (EUA, Canadá, Japão, Cingapura, Coréia do Sul, Nova Zelândia, Suíça e Marrocos).
Esse acordo visa combater não só produtos piratas e que violem a propriedade intelectual, mas também estabelece a obrigação dos países de combaterem futuras infrações de propriedade intelectual. Se parece uma linguagem vaga, é porque é. Mas, levada às últimas consequências, a prevenção de futuras infrações pode incluir até a proibição de se gravar um programa de TV para assisti-lo depois (afinal, tecnicamente, você pode estar violando os direitos autorais se você gravar um programa ou uma música sem autorização) ou a proibição de se fabricar aparelhos de DVD, CD ou software que possibilitem esse tipo de gravação
O Brasil é um país que desenvolve poucos produtos patenteados, e talvez seja por isso que tendamos a tomar sempre o mesmo lado na discussão. O último relatório (publicado em setembro) pela Organização Mundial de Propriedade Intelectual mostra que em 2010 o Brasil requisitou apenas 487 patentes, o que é muito pouco comparado com os países desenvolvidos:
- Alemanha: 17.568
- Coréia do Sul: 9.669
- EUA: 44.940
- França: 7.245
- Holanda: 4.060
- Japão: 32.148
- Reino Unido: 4.891
- China: 12.296
- Índia: 1.285
- Rússia: 784
A outra vantagem de ter uma patente é que ela pode ser licenciada a mais de um país ao mesmo tempo. Quando uma pessoa registra sua patente através do PCT, ela está protegendo seus direitos em todos os países signatários daquele acordo. E mais: enquanto uma banana só pode ser exportada para uma pessoa porque, afinal, aquela banana é única e não pode estar em dois lugares ao mesmo tempo, a patente, por ser algo abstrato (imaterial), pode ser licenciada para várias pessoas ao mesmo tempo. Um fabricante na China pode estar usando a mesma ‘planta’ que um fabricante nos EUA, ao mesmo tempo, e o dono da patente recebe duas vezes pela mesma coisa, e a coisa ainda continua sendo dele para ser licenciada a outras empresas pelo mundo.