"Publicar dados não livra poder público da sua responsabilidade
Privacidade e democracia não são sinônimos e não estão correlacionados. E, mesmo que fossem, quem infringe uma norma legal perde sua expectativa de privacidade.
Logo, a disponibilização da lista de imóveis embargados em São Paulo não atenta contra a democracia ou o direitos dos infratores. A transparência gera coesão social ao possibilitar a fiscalização mútua.
Se há um absurdo jurídico no caso das obras embargadas é o fato de os dados não terem sido disponibilizados antes. Afinal, qualquer um tem o direito de saber se o prédio ao lado põe sua vida em risco.
Mas há problemas que não serão resolvidos pela simples disponibilização dos dados on-line. A responsabilidade de fiscalizar é do poder público e não pode ser delegada à sociedade. Tampouco a publicação pode significar a abdicação da obrigação estatal.
É situação análoga à dos anúncios de segurança em aeroportos ao redor do mundo: o fato de a polícia pedir para ser avisada caso alguém note um comportamento estranho não a autoriza a abdicar de seu dever ou a depender do voluntarismo alheio.
Não adianta disponibilizar dados e pedir às pessoas que alertem sobre irregularidades se tais alertas se perderem na burocracia ou se a prefeitura não tomar medidas efetivas.
A inação do governo tornaria inócuo o apoio social.
Tampouco a disponibilização dos dados resolve a causa do problema: compensa desrespeitar a legislação de planejamento urbano.
Não é apenas o risco de ser descoberto que é pequeno: o risco de ser punido de forma efetiva é mínimo.
A combinação entre a morosidade da Justiça, as anistias pelo Legislativo, o lobby da indústria e o fato de que quem constrói de forma irregular quase nunca ser quem mora no prédio neutraliza as tentativas do Executivo de punir infratores de forma exemplar".