“”Advogados pedem que juiz se declare suspeito e deixe caso
Os advogados dos executivos da OAS presos desde novembro pediram nesta quarta (21) ao juiz Sergio Moro que se declare suspeito e deixe a condução da Lava Jato.
Os advogados também pediram a nulidade de provas e do processo. Eles argumentam que, em 2010, o juiz havia se declarado suspeito por razões íntimas para atuar em um inquérito que tratava do doleiro Alberto Youssef.
Naquele inquérito, Moro se apresentou em dificuldade para continuar no caso porque discordou do encaminhamento dado pelo Ministério Público Federal a um acordo de delação premiada fechado com o doleiro em relação ao caso Banestado, que desvendou remessas ao exterior.
Para a OAS, a decisão anterior de Moro o impediria de conduzir ‘qualquer outro processo em que estivesse envolvido o corréu [Youssef]’ (…)
Em sua defesa prévia, a Galvão Engenharia pediu a transferência do processo para o Rio, sob a alegação de que lá fica a sede da Petrobras.”
Magistrado suspeito é aquele que tem uma relação de amizade ou inimizade com uma das partes que pode colocar sua imparcialidade em cheque.
Não é qualquer relação de amizade ou inimizade que gera dúvida sobre sua imparcialidade. Se fosse assim, qualquer gesto de cordialidade ou frustração de um magistrado durante um julgamento (ou mesmo antes dele) o tornaria automaticamente suspeito. Tal amizade ou inimizade precisa ser juridicamente relevante para que gere a suspeição.
Ademais, relações humanas tendem a serem modificadas pelo tempo. Alguém em relação a quem você não sente nada hoje pode ser seu esposo em um ano, e seu amigo hoje pode se tornar mais um mero conhecido perdido na multidão em poucos anos. Olhe sua agenda ou emails antigos e verá que suas relações mudaram com o tempo. O mesmo ocorre com um magistrado: ele pode ter se declarado suspeito no passado mas hoje ser completamente indiferente em relação àquela pessoa, ou pode ter sido indiferente em relação a alguém no passado e ser absolutamente suspeito em relação àquela mesma pessoa hoje. Magistrados não são imunes à passagem do tempo. Como qualquer outra pessoa, suas emoções e pensamentos evoluem (ou regridem, em alguns casos).
Logo, na reportagem acima, um magistrado ter se declarado suspeito no passado não o torna automaticamente suspeito no presente, mesmo que as partes sejam exatamente as mesmas.
Mas há um outro ponto interessante nesse debate: qual o interesse de um advogado em afastar um magistrado de um processo?
Se a lei é clara, não importa o magistrado a julgar a causa: o resultado deve ser necessariamente o mesmo, certo?
Não. Primeiro, a maior parte das leis não são claras. Segundo, ainda que elas fossem todas claras e objetivas, a análise e interpretação dos fatos aos quais elas serão aplicadas é sempre subjetiva. E, terceiro, mesmo que fatos e leis fossem claros e objetivos, as leis sempre possibilitam certo escopo de aplicação ao magistrado. Segundo a lei, a pena de homicídio não são 6 anos ou 20 anos. Ela varia de 6 a 20 anos. E a subjetividade de um magistrado impera nessa determinação.
Estes são os argumentos técnicos e democráticos. Mas há também possibilidades bem menos louváveis. Quando se muda um magistrado ou o local onde o processo corre, o novo magistrado perde tempo em se familiarizando com o processo. Se o julgamento atrasa, o crime pode prescrever.
Alguns magistrados são mais técnicos; outros, mais influenciáveis. Alguns magistrados são mais céleres; outros, bem menos. Alguns locais são mais seguros; outros, menos. Alguns magistrados têm mais conhecimento técnico em relação a pontos não relacionados ao mundo do direito; outros têm um conhecimento muito mais limitado.
Daí o pedido de suspeição de um magistrado precisar sempre ser tratado com muita cautela.