“Ex-funcionária de Valério pede para não ser presa
A funcionária que entregou milhões de reais em espécie para os partidos políticos beneficiados pelo mensalão admite que errou ao cumprir ordens do empresário Marcos Valério Fernandes de Souza e diz que não merece ir para a prisão pelo que fez.
Simone Vasconcelos, 55, era diretora financeira da agência de publicidade SMPB, uma das empresas usadas para distribuir o dinheiro do esquema organizado pelo PT no governo Lula.
Ela foi condenada pelo Supremo Tribunal Federal pelos crimes de corrupção ativa, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Sua pena ainda não foi definida pelo tribunal (…)
Folha - Qual a sua opinião sobre o julgamento do STF?
Simone Vasconcelos - É um sofrimento de sete anos. Há uma diferença gritante entre mim e a [ex-gerente da SMPB] Geiza Dias, que felizmente foi inocentada, e a grande maioria dos réus. A nossa pura inocência é que me levou a estar nesse processo. Uma inocência burra. Eu tinha a expectativa de ser inocentada, inclusive pelo [ministro do STF] Joaquim Barbosa.
Como viu suas condenações?
Sou acusada de evasão. Não sei o que é isso. E uma quadrilha em que só conheço três, os ex-sócios [de Valério]? Corrupção? Quando você corrompe alguém, você quer alguma coisa. Quem eu corrompi para ganhar o quê? Depois soube que era para uma votação da Previdência, não é isso? Isso é briga de cachorro grande, e eu estou lá (…)
E a possibilidade de ser presa?
Estou fazendo um trabalho mental, espiritual. Se for necessário, eu vou, com dignidade, trabalhar lá dentro, com gestantes, ajudar a cuidar. Vai ser meu modo de me manter viva. Eu sou do bem. Se eu errei? Claro que errei, errei sim. O erro de ter aceitado a ordem para entregar os valores. Eu provavelmente perderia meu emprego, porque Marcos Valério nunca foi um chefe amigo, ameno”
O contrário do ‘bem’ é o ‘mal’. O contrário da inocência é a culpa. Embora usemos esses termos como sinônimos no dia a dia, 'crime', 'maldade' e 'violência' são coisas muito diferentes.
Porque a personagem da matéria acima foi considerada culpada de um crime pelo STF, e como não há recurso contra o acórdão do STF que a condena, podemos dizer que ela é uma criminosa (se ainda coubesse recurso, não poderíamos dizer isso. Teríamos que dizer que ela ‘foi condenada mas ainda cabe recurso’). Enfim, ela cometeu um crime.
Crime é algo objetivo: ou está na lei penal e é crime; ou não está, e não é crime. Logo, se o Judiciário decidiu que a conduta dela é a proibida pela lei, ela é uma criminosa. Se não fosse proibida pela lei, ela seria considerada inocente.
Mas nem tudo que é crime é violento, e nem tudo que é violento é crime. Há crimes que não são violentos (por exemplo, a lavagem de dinheiro e a evasão, dois dos crimes que ela praticou); e há violências que não são crimes (a palmada na criança ou furar o corpo alheio para colocar um brinco ou piercing são violências físicas, não são delitos. O fim de um namoro muitas vezes é uma violência emocional, e nem só por isso é crime).
Crime é aquilo que a sociedade rejeita; violência é aquilo que fere (física ou emocionalmente). Às vezes eles coincidem, mas a existência de um não depende da existência do outro.
Já bem e mal são conceitos morais e, por isso, essencialmente pessoais, subjetivos. Depende de sua opinião. Napoleão foi um herói para os franceses e vilão para os britânicos. O Dalai Lama é uma fonte de bem para os budistas (e a maior parte dos ocidentais) mas do mal para o governo chinês e muitos chineses. Pergunte a um palestino e a um israelense que sociedade está do lado do bem, e você receberá respostas muito diferentes. O mesmo a um militante do PT e a um do PSDB.
No caso da personagem da matéria acima, ela é uma criminosa porque esse é um conceito objetivo: ela agiu contra a lei. Mas ela pode achar que agiu bem porque esse é um conceito subjetivo: é a opinião que ela tem dela mesma.
Por fim, há uma diferença entre ser culpado e ser condenado. Ela é culpada, mas não necessariamente condenada. É isso que o STF está decidindo agora. Alguém pode ser culpado mas não ser condenado (cuidado porque ambas as coisas são decididas na sentença ou acórdão).
Por exemplo, recentemente o jornal publicou que
“A Islândia é uma ilha com pouco mais de 300 mil habitantes que parece decidida a inventar a democracia do futuro.
Por uma razão não totalmente clara, esse país que fora um dos primeiros a quebrar com a crise financeira de 2008 sumiu em larga medida das páginas da imprensa mundial. Coisas estranhas, no entanto, aconteceram por lá (…)
Os executivos dos bancos foram presos e o primeiro-ministro que governava o país à época da crise foi julgado e condenado”
Na verdade, ele foi julgado e considerado culpado, mas ele não foi condenado: ele não sofrerá nenhuma sanção (exceto a execração moral de sua sociedade), como publicaram corretamente outros jornais.