“O advogado Ércio Quaresma responde a 11 processos na seção da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de MG, que enfrenta pressão para suspendê-lo do exercício profissional.
Defensor do goleiro Bruno Fernandes no caso do desaparecimento e suposta morte de sua ex-amante Eliza Samudio, Quaresma disse nesta semana em entrevista que é viciado em crack há oito anos.
Na próxima semana, o Tribunal de Ética e Disciplina da OAB decide se pune o advogado por ‘conduta incompatível’ e deverá suspendê-lo até o julgamento do mérito. Quaresma não foi localizado ontem.”
E por que ele será julgado pela OAB?
A advocacia, assim como algumas outras profissões (como a engenharia, a medicina, a contabilidade, a farmácia, a odontologia, a veterinária e a arquitetura), são profissões cujo o exercício é controlado.
Nossa constituição dá o direito de qualquer pessoa exercer qualquer profissão. Mas para exercer algumas delas, a pessoa precisa de uma autorização. Essa autorização é dada baseada em critérios técnicos, como o conhecimento da matéria e a experiência. Você não quer, por exemplo, que alguém que nunca estudou anatomia seja responsável por sua cirurgia. É por isso que a medicina só pode ser exercida por quem se formou em medicina.
Da mesma forma, a advocacia só pode ser exercida por quem se formou em direito e comprovou que aprendeu o que deveria ter aprendido na faculdade. Esse segundo critério é verificado através da famosa prova da OAB.
Mas o fato de alguém ter recebido sua autorização para exercer essas profissões (registro da OAB para os advogados, CRC para os contadores, CRF para os farmacêuticos, CRM para os médicos, CREA para os engenheiros e arquitetos, CRO para os odontologistas, CRMV para os médicos veterinários) não quer dizer que ele possa exercer sua profissão de qualquer maneira. Eles continuam o tempo todo sob 'supervisão'. Seja em relação a critérios objetivos ou subjetivos.
Da mesma forma que o farmacêutico que participar de experimentos em seres humanos com fins bélicos, raciais ou eugênicos pode perder seu registro, um advogado que viola o sigilo profissional pode ter sua autorização para exercer a advocacia cassada pelo mesmo órgão que a concedeu: OAB. Esse é um critério objetivo.
Mas o mesmo advogado pode também ter sua ‘OAB cassada’ se agir de forma contrária aos princípios morais da profissão. É o que diz, por exemplo, o artigo 34, inciso XXVII da lei 8906 (o chamado Estatuto da OAB): “tornar-se moralmente inidôneo para o exercício da advocacia”. A lei não diz o que é ‘moralmente inidôneo’, mas todos nós temos algum exemplo de alguém que seja moralmente inidôneo. A lei achou melhor deixar a critério da comissão de Ética da OAB decidir, caso a caso, se a pessoa agiu de forma inidônea.
Mas o uso de drogas pelo advogado entra aí? Não. Ele está previsto no inciso XXV do mesmo artigo, que diz que é infração disciplinar “manter conduta incompatível com a advocacia”. A princípio pode parecer tão ou mais subjetivo que a inidoneidade moral. Foi por isso que, para não haver dúvida, no parágrafo único do mesmo artigo a lei disse que “inclui-se na conduta incompatível: a) prática reiterada de jogo de azar, não autorizado por lei; b) incontinência pública e escandalosa; c) embriaguez ou toxicomania habituais”. Reparem que nas alíneas ‘a’, ‘b’, e ‘c’ ela usa critérios objetivos, inclusive fazendo referência direta ao caso da matéria acima: toxicomania habitual, ou seja, quem usa drogas de forma recorrente. Mas ela também deixa o espaço subjetivo para outras condutas, quando usa a expressão “inclui-se”. Isso significa que há outras hipóteses de condutas incompatíveis além das enumeradas em ‘a’, ‘b’, e ‘c’, e que ficam a cargo da Comissão de Ética defini-las nos casos específicos, quando ocorrerem.
O julgamento a ser feito pela OAB é sobre o direito de continuar a exercer a profissão de advogado. O julgamento a respeito do uso de drogas - que é crime - será feito, obviamente, pela justiça, que é a única instituição autorizada a condenar alguém penalmente.
PS: Vale lembrar que, atualmente, e ao contrário das profissões apontadas acima, a profissão de jornalista pode ser exercida por qualquer pessoa, independente de formação em faculdade de jornalismo.