“A Justiça de Minas condenou em primeira instância os pais de um aluno do colégio Santa Doroteia, instituição de classe média alta no bairro Sion, zona sul de Belo Horizonte, a pagar uma indenização de R$ 8.000 pela prática na escola, pelo filho, de bullying (intimidação moral) contra outro estudante.
A vítima que receberá a indenização é uma menina de 15 anos, colega de sala do estudante agressor quando a denúncia foi oferecida, em setembro de 2008. Eles cursavam a 7ª série.
(...)
Conforme a sentença do juiz Luiz Artur Rocha Hilário, da 27ª Vara Cível de Belo Horizonte, o adolescente xingou e ofendeu sua colega, chamando-a de ‘g.e.’, que viria a ser "grupo das excluídas", pelo fato de se relacionar com outras colegas que eram classificadas pelo estudante como ‘lésbicas’.
A vítima foi classificada ainda de ‘interesseira’ e ‘prostituta’ por ter começado a namorar um colega mais rico do colégio. Os apelidos e insinuações não cessaram mesmo após os pais da aluna se queixarem à escola.”
E saiu ontem (19/05/10) na Folha:
“A Justiça gaúcha determinou que os pais de um adolescente que agrediu a professora dentro da escola há quase dois anos paguem a ela R$ 2.000 de indenização. A agressão ocorreu numa escola estadual de Jaguarão (383 km de Porto Alegre), quando o menino tinha 13 anos e cursava a 5ª série.
Em decisão de segunda instância, tomada em 29 de abril, o Tribunal de Justiça do RS reconheceu o direito da professora Vera Lúcia Meirelles Meroni, 48, de ser indenizada. Em primeira instância, os pais haviam sido condenados em 2009.
A professora diz que o menino estava jogando frutos de cinamomo em outra aluna, no recreio, quando ela o repreendeu. ‘De uma hora para outra, ele salta e, com uma das mãos, segura meu braço, e, com a outra, me dá tapas e tapas sem parar.’”
Reparem que as famílias não foram condenadas criminalmente: elas foram condenadas civilmente. A condenação criminal é uma punição, já a condenação civil (que foi o caso da matéria acima), é uma reparação do dano ou readequação da situação.
E como sabemos que a condenação acima foi civil e não penal? Existem duas formas muito simples. Primeiro, colando: na matéria de hoje, o juiz que condenou é da 27a Vara Cível. Ora, o juiz da área cível não tem competência para condenar penalmente. E vice-versa.
A segunda forma, que é a mais interessante para aprendermos, é um pouco mais complicada. Para entendê-la, precisamos entender duas coisas antes:
Primeiro, de acordo com a nossa Constituição “nenhuma pena passará da pessoa do condenado”. Isso significa que ninguém pode ser punido penalmente no lugar de outra pessoa. Uma mãe não pode ser punida criminalmente pelo homicídio cometido pelo seu filho contra a vizinha, e nem um esposo pode ser condenado a cumprir uma pena pela lesão corporal cometida por sua esposa contra o padeiro. Mas, civilmente, a condenação pode ultrapassar àquele que perdeu a causa. Por exemplo, vira e mexe ouvimos falar que um jornal foi condenado pela matéria escrita por um de seus jornalistas, ou que o governo terá de indenizar pelo dano causado por um de seus servidores, ou que a empresa terá de indenizar o consumidor lesado por seu funcionário.
Segundo, existe em direito civil algo chamado culpa in vigilando. Culpa in vigilando significa que somos civilmente responsáveis pelas ações daqueles de quem devemos tomar conta. Se um cachorro come as flores da vizinha ou se uma criança quebra a sua janela, o dono do cachorro ou os pais da criança terão de indenizar a vizinha. Não porque eles tenham praticado ou autorizado a prática das ações que causaram o dano, mas porque eles tinham a obrigação de vigiar aqueles que causaram o dano. Eles não vigiaram como deveriam e, por isso, são culpados civilmente.
No caso da matéria acima, os pais foram condenados civilmente porque eles tinham a obrigação de tomar conta para que a criança não causasse dano (moral, na primeira matéria; e material, na segunda). Como não tomaram, terão de reparar o dano causado por seus filhos.