"A defesa de Daniel Dantas apresentou ontem mesmo recurso contra a condenação e afirmou que a sentença do juiz Fausto De Sanctis é "delirante". Nélio Machado, advogado do banqueiro, disse que o recurso objetiva demonstrar a nulidade da sentença e a inconsistência da acusação.
"A sentença é delirante. O juiz aplaudiu a si próprio. A pena é despropositada. Nem estupradores têm uma pena tão grande." Para o advogado, "o juiz é suspeito e a sentença ratifica a suspeição dele"
Machado afirma que não dá para imaginar que De Sanctis excluiu a prisão para transmitir a imagem de ponderado. "Não dá para parecer um juiz ponderado condenando um réu primário a dez anos de prisão. Mesmo que pudesse condenar, ele não poderia dar uma pena de homicídio qualificado.""
E no texto seguinte:
"Criminalistas consideraram "exacerbada" a sentença do juiz Fausto Martin De Sanctis. O advogado Antônio Cláudio Mariz de Oliveira diz que "foi correta" a decisão de permitir que Daniel Dantas recorra em liberdade, mas considerou "elevada" a pena de dez anos de prisão, multa de R$ 1,425 milhão e reparação de R$ 12 milhões.
Na sua opinião, Daniel Dantas não criou nenhum embaraço para o processo: "Não é um crime confirmado, mas uma tentativa de corrupção", afirma Mariz de Oliveira."
Vários erros dos advogados:
"Nem estupradores têm uma pena tão grande". A pena para o crime de estupro simples (art. 213 do Código Penal) é de 6 a 10 anos. Logo, é possível, sim, um estuprador ser condenado a 10 anos de prisão. Em suas formas qualificadas, o estupro tem uma pena de até 14 anos (se há lesão corporal grave) ou 25 anos (se a vítima morre). E mesmo se o crime cometido for estupro simples, a pena pode ser aumentada em até 2.5 anos se mais de uma pessoa estiver envolvida, ou até 5 anos se o criminoso for ascendente, padrasto, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima.
"Não dá para parecer um juiz ponderado condenando um réu primário a dez anos de prisão". Na verdade, dá sim. A primariedade do réu não dita sua pena. O crime de latrocínio, por exemplo, tem uma pena que varia de 20 a 30 anos. Logo, o juiz necessariamente teria que aplicar uma pena acima de 10 anos. A pena é relativa ao crime, e não à primariedade. A primariedade é apenas um entre muitos outros elementos que o magistrado utiliza para determinar a pena entre os valores mínimo e máximos previstos pela lei. Quando o juiz estabelece a pena, ele olha a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, os motivos, as circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima. Reparem que a primariedade sequer está mencionada de forma explicita nesta lista (art. 59 do Código Penal), mas implícita nos antecedentes.
"Ele não poderia dar uma pena de homicídio qualificado.". Claro que não poderia, e não o fez. Ele aplicou a pena para o crime de corrupção ativa, que varia entre 2 e 12 anos. Ou seja, ele sequer aplicou a pena máxima. Se ele tivesse aplicado uma pena de homicídio qualificado, a pena variaria de 12 a 30 anos (art. 121 § 2° do Código Penal).
"Não é um crime confirmado, mas uma tentativa de corrupção". Aqui ele quis dizer consumado. Crime consumado é aquele no qual o criminoso é bem sucedido em sua intenção criminosa.
Sempre que for conversar com um jurista, seja advogado, magistrado ou MP, cheque, pois nós falamos muita bobagem, especialmente quando falamos no calor do momento.