“Os fundadores da Igreja Renascer, Estevam e Sônia Hernandes, foram condenados a quatro anos de prisão e ao pagamento de R$ 1,06 milhão de multa mais indenização por terem viajado do Brasil aos Estados Unidos, em janeiro de 2007, com US$ 56,4 mil não declarados.
A sentença foi dada anteontem pelo juiz federal Fausto Martin De Sanctis, da 6ª Vara Criminal de São Paulo, que substituiu a pena de prisão pela prestação de serviços à comunidade e restrição temporária de direitos -proibição de viajar para o exterior sem autorização judicial ou de frequentar determinados lugares, como lotéricas, haras e lojas de luxo.
O cumprimento da pena não é imediato. Sônia e Hernandes vão recorrer em liberdade.
Em 2007, o casal foi preso assim que chegou a Miami, com dólares escondidos em malas e em uma Bíblia. Condenado pela Justiça norte-americana, cumpriu pena em regime fechado e só voltou ao Brasil em agosto deste ano.
A procuradora Karen Kahn, responsável pelo caso, pediu a pena mínima, de dois anos de prisão, para o casal. "Entendo que eles já foram punidos por um crime que tem o mesmo perfil nos EUA, o que seria um atenuante. Eles já pagaram pelo transporte do dinheiro."
Para De Sanctis, a prisão nos EUA não interfere nem anula a responsabilidade de a Justiça brasileira se pronunciar sobre o crime, como pediu o advogado Luiz Flávio Borges D'Urso, que defende o casal.
"Fatos distintos e passíveis de punição foram praticados também em momentos diversos: ao embarcarem no Brasil, violando a legislação brasileira, [...] e ao adentrarem nos EUA, com declarações falsas perante a aduana norte-americana", afirmou De Sanctis.”
Acertou o juiz. Errou a procuradora. Segundo ela, houve apenas um crime. Na verdade, ocorreram dois crimes: o primeiro ocorreu no Brasil, quando eles saíram sem declarar o dinheiro. Este crime é um crime previsto pelas leis brasileiras, punível no Brasil. Os EUA não tem nada a ver com ele. O segundo crime ocorreu nos EUA, quando eles tentaram entrar no território americano sem declarar o dinheiro. Esse é um crime previsto na lei norte-americana, punível nos EUA, e o Brasil não tem nada a ver com ele. Não importa o fato de que eram as mesmas pessoas e o mesmo dinheiro. Se eles tivessem declarado a saída dos bens aqui no Brasil, ainda assim seriam punidos nos EUA. E se tivessem declarado a entrada do dinheiro nos EUA, ainda assim seriam punidos no Brasil. Foram duas condutas distintas em dois países distintos, em dois momentos distintos; portanto, dois crimes distintos.
Ela errou uma segunda vez ao dizer que o crime foi o transporte do dinheiro. Transportar dinheiro – seja R$1, seja R$1 bilhão – não é crime. Não respeitar as normas tributárias sobre a entrada e/ou saída de divisas de um pais, é crime.
Por fim, a procuradora também erro quando disse que a condenação nos EUA é uma atenuante. O art. 65 do Código Penal é claro a respeito do que consiste uma atenuante:
“Art. 65 - São circunstâncias que sempre atenuam a pena:
I - ser o agente menor de 21 (vinte e um), na data do fato, ou maior de 70 (setenta) anos, na data da sentença;
II - o desconhecimento da lei;
III - ter o agente:
a) cometido o crime por motivo de relevante valor social ou moral;
b) procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as conseqüências, ou ter, antes do julgamento, reparado o dano;
c) cometido o crime sob coação a que podia resistir, ou em cumprimento de ordem de autoridade superior, ou sob a influência de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima;
d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime;
e) cometido o crime sob a influência de multidão em tumulto, se não o provocou”
O caso vale para mostrar também como juristas (não importa se advogados, magistrados ou membros do Ministério Público), também estão sujeitos a cometerem erros bobos.