“Bruno, do KLB, é atropelado em frente a casa noturna
O cantor Bruno, do grupo KLB, foi atropelado na madrugada de ontem, após sair de uma casa noturna em São Paulo.
Ele sofreu escoriações nas pernas e no quadril e levou cerca de 30 pontos nos dois braços. O cantor ficou algumas horas internado no Albert Einstein, mas já foi liberado (…)
A jovem que atropelou o cantor fez teste do bafômetro e chegou a ser detida, mas foi liberada após pagar fiança. Segundo a família de Bruno, ele conhece a motorista e não vai prestar queixa contra ela”.
Há dois problemas aqui: primeiro, a expressão ‘prestar queixa’, do ponto de vista técnico, está incorreta. Quando você leva ao conhecimento da polícia a ocorrência de um crime (contra você ou um terceiro), você não está prestando queixa: você apresenta uma notícia-crime.
Queixa(-crime) é o que você apresenta à Justiça (e não à polícia) quando você é vítima de um crime de ação penal privada (como uma injúria). E é aqui que entra o segundo erro:
A probabilidade de alguém ser atropelado duas vezes é baixa. Mas a probabilidade de um criminoso atropelar pessoas diferentes é grande. Logo, o interesse social de tirar esse motorista das ruas é maior do que o interesse da própria vítima. Por isso não interessa se a vítima perdoa ou não o criminoso: se ele atropelou, ele deve responder um processo.
É a mesma coisa que acontece com quem mata, rouba, ou vende drogas. A bem da verdade, é o que acontece na maior parte dos crimes: o interesse da sociedade é maior do que o da própria vítima. Por isso o processo é movido independente da vontade da vítima.
Isso é o que chamamos de ação penal pública (incondicionada), ou seja, ela será movida pelo Ministério Público independentemente (incondicional à) vontade da vítima. A maior parte dos crimes entra nessa categoria (ela é a regra geral). Apenas quando a lei fala expressamente que a ação penal só pode ser movida pela vítima ou seu representante (ação penal privada) ou pelo Ministério Público depois de receber a representação da vítima (ação penal pública condicionada) é que ela deixa de ser pública.
Mas então para que serve a notícia-crime? Por que perdemos tempo levando o crime ao conhecimento da polícia se o Ministério Público, na maioria dos casos, age independentemente da vontade da vítima e o delegado pode instaurar o inquérito independente da apresentação de uma notícia-crime pela vítima. Simples: quase nunca a polícia vai saber que um crime ocorreu se nínguem informa que tal crime ocorreu. O delegado pode iniciar a investigação, mas precisa primeiro saber que o crime ocorreu. Ademais, o inquérito serve para investigar os fatos e como base para um futuro processo: na prática, fica muito mais difícil uma condenação se a própria vítima não diz o que aconteceu. Ao dar sua versão dos fatos, a vítima ajuda o delegado a entender o que aconteceu, o que fortalece, mais adiante, a acusação a ser apresentada pelo Ministério Público contra o criminoso.