O regime fechado (o mais severo) é cumprido em penitenciárias. Penitenciária é o local que a maior parte das pessoas associam com o antigo Carandiru ou com as prisões em filmes. É aquele local cheio de ‘gaiolas’ nas quais os presos passam boa ou a maior parte de seu tempo confinados, com direito a banho de sol por poucas horas por dia e com constante supervisão dos carcereiros.
Já o regime semiaberto é cumprido em colônias agrícolas e industriais. Esses são bem mais raros no Brasil. Neles os criminosos passam o dia trabalhando em hortas ou pequenas indústrias dentro dos muros da prisão. Eles ainda passam o tempo todo sob supervisão, mas a sensação de estarem confinados é bem menor. Não é a mesma coisa que os presos com bolas de ferro em suas canelas e vigiados por policiais a cavalo que vemos em alguns filmes americanos, mas a ideia é mais ou menos parecida: passam o dia trabalhando em um local relativamente aberto.
Já o regime aberto (o menos severo) é cumprido em casas de albergados, que nada mais são do que locais onde os presos passam a noite e os fins-de-semana e feriados. É no regime aberto que os criminosos têm o direito de passarem o dia fora, junto com o resto da população. Nelas, funciona o sistema de autofiscalização: o criminoso é responsável por fiscalizar seu comportamento. O carcereiro não o vigia fora da casa de albergados. Nesse exato momento você pode estar sentado ao lado de alguém em regime aberto e não sabe.
Isso é o que está na lei. Mas então por que sempre vemos matérias de jornal dizendo que presos em regime semiaberto têm direito a ficarem soltos durante o dia?
Por três motivos logísticos, todos relacionados com a ineficiência dos governos em construírem colônias para o regime semiaberto.
Como as poucas colônias estão quase sempre lotadas e não há colônia suficientes para acolherem todos os presos em regime semiaberto, como presos que estejam em regime semiaberto não podem ser prejudicados pela ineficiência do Estado em construir e manter colônias, e como o trabalho é um direito do preso em regime semiaberto, a Justiça teve de encontrar um subterfúgio (o famoso ‘jeitinho’): tratar quem está em regime semiaberto como se estivesse em regime aberto. Ou seja, em vez de o criminoso passar o dia trabalhando na colônia, ele passa o dia trabalhando fora, com o resto da população.
Mas esse não é um direito automático. Se houver vagas em colônias daquela unidade federativa, os presos em regime semiaberto naquele Estado não podem simplesmente exigirem trabalhar fora. Esse direito só existe quando não há lugar para ele nas colônias.
Aqui aparece um outro problema: também não há casa de albergados suficientes para acolherem todos os criminosos em regime aberto. Ou seja, os criminosos acabam dormindo em casa.
É por isso, por exemplo, que os criminosos em regime semiaberto na matéria acima foram presos. Se estivessem em regime aberto, o direito de só ficarem presos no fim de semana e a noite já seria automático. Como estão em regime semiaberto, seus advogados terão de pedir o direito de saírem para trabalhar se não for possível cumprirem as penas em regime semiaberto como previsto pela lei. Veja, por exemplo, a matéria publicada na Folha de sábado (16/11/13):
“Quando os condenados forem entregues, o juiz deverá enviar ao presídio da Papuda os presos que ficarão em regime inicialmente fechado, como Marcos Valério e seus ex-sócios Paz e Hollerbach.
Aqueles que forem enviados para o regime semiaberto, como Dirceu, Genoino e o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, ficarão no CPP (Centro de Progressão Penitenciária), situado a cerca de 15 minutos do centro de Brasília.
Os presos enviados ao CPP, entretanto, terão de receber uma autorização da Justiça antes de poderem sair do estabelecimento prisional durante o dia para trabalhar.
Todos deverão pedir à Justiça para serem transferidos para seus Estados de origem, o que sugere um trâmite algo demorado até eles de fato desfrutarem da possibilidade de só dormir na cadeia [sic: cadeia é onde ficam presos aguardando julgamento]”
Esse somatório de problemas gera um perigo que quase sempre passa desapercebido. Nosso sistema de execução de penas é baseado na ideia de reabilitação gradual. À medida que o tempo passa e o criminoso prova – através de bom comportamento – que está apto à reinserção social, ele vai progredindo de regimes mais severos para mais brandos. Mas se ele passa a pular do regime fechado direto para a liberdade, o processo de reabilitação gradual e incentivo ao bom comportamento deixa de existir (e o mesmo ocorre se ele é condenado a começar a cumprir a pena inicialmente em regime semiaberto e sabe que vai já começar direto em liberdade como se estivesse em regime aberto ou, pior, em liberdade condicional). Some-se a isso o fato de que as penas no Brasil são propositalmente baixas (justamente porque a ideia é reinserir o criminoso na sociedade com o passar do tempo), acabamos com criminosos – mesmo aqueles que estejam em regime fechado – passando muito pouco tempo realmente presos. Saem da ‘gaiola’ direto para a liberdade plena ou quase plena.