"Em um vídeo divulgado ontem pela TV Record, Lindemberg Alves Fernandes afirmou que não sabia que tinha atirado na menina Nayara, amiga da sua ex-namorada Eloá.
Nas imagens, Lindemberg aparece algemado, com as mãos para trás, sem camiseta, em frente a uma cela e com o rosto machucado. Segundo a emissora, que não informou quando e por quem o vídeo foi feito, as imagens foram feitas logo após ele ser preso.
Ele responde a perguntas inaudíveis feitas por pessoas que não aparecem. "Eu atirei no sofá. Eu acho que atirei primeiro na Eloá", diz. "Um [tiro] foi eu que dei. Eu lembro que dei um na Eloá."
"Na Nayara, eu nem sabia que tinha atirado na Nayara."
Lindemberg explica na gravação que "depois da bomba [usada pela polícia para arrombar a porta do apartamento], eu não vi mais nada. Eu ouvi gritos." De acordo com a PM, a invasão ocorreu porque Lindemberg teria feito um disparo.
No vídeo, no entanto, ele não esclarece se o momento da invasão da PM foi antes ou depois de ele ter atirado. "Eu não estava pensando que a polícia ia lá, nem nada. Eu tava pensando em curtir cada minuto com ela [Eloá], ao lado dela. Só beijo no rosto. Ela me beijava no rosto."
Também disse que 'queria voltar no tempo' e pôr fim ao ciúmes que tinha de Eloá.
Ontem, a advogada Ana Lúcia Assad ouviu o rapaz no CDP (Centro de Detenção Provisória), em Pinheiros. Segundo ela, o rapaz disse que só atirou após a polícia invadir o local.
Diferentemente do que Lindemberg disse na gravação, a advogada afirma ainda, que ele atirou a esmo -sem intenção de acertar nas duas garotas.
A advogada pediu que Lindemberg escrevesse uma carta de próprio punho na qual ele dizia se sentir ameaçado e que temia pela sua integridade física e por sua vida."
Esse último parágrafo é importante do ponto de vista jurídico. O que a advogada esta tentando fazer pedindo que Fulano diga que se sentia ameaçado é construir a base para, mais tarde, alegar que ele atirou em legitima defesa. Em outras palavras, que ele atirou para se defender por estar se sentido em perigo.
A legítima defesa ocorre quando, para defender um bem jurídico (no caso acima, a vida), a pessoa faz algo que, em outras circunstâncias, seria considerado um delito. Por exemplo, a legítima defesa ocorre quando alguém, para se proteger, atira no criminoso que o ameaçava com uma arma. Se você atira em alguém em uma situação normal, você cometeu um crime (homicídio), mas se você atira em um criminoso que apontava uma arma contra você, não há o crime, pois você estava protegendo um bem jurídico (sua vida) que estava no mesmo (ou maior) nível do que o bem jurídico ofendido (a vida do outro).
Essa relação entre os bens jurídicos protegido e ofendido é importante. Você não pode alegar legítima defesa se você mata para proteger seu patrimônio durante um furto. Neste caso, o bem jurídico protegido (seu patrimônio) é menos importante que o bem jurídico ofendido (a vida do criminoso). Neste exemplo, se o bandido nao colocou sua vida em perigo, não há legítima defesa pois há uma desproporcionalidade negativa entre o que você ofende (tirar a vida de alguém) e o que você pretende proteger (seu patrimônio).
A legítima defesa é uma das hipóteses do que chamamos de exclusão de ilicitude (ou tipicidade). Ou seja, a legítima defesa exclui o elemento de ilicitude que, de outra maneira, existira naquela ação. As outras hipóteses são o estado de necessidade, o estrito cumprimento do dever legal e o exercício regular do direito.
O problema da tática adotada pela advogada de defesa acima é que você não pode alegar legítima defesa (ou estado de necessidade) quando foi você mesmo quem causou a situação de perigo. Se voce provoca a situação, não pode depois alegar que estava apenas se defendendo, pois você não teria que se defender se não tivesse causado a situação em primeiro lugar.