“A bancada do PT no Senado decidiu ontem defender publicamente o projeto que acaba com o sigilo eterno de documentos oficiais, contrariando a presidente Dilma Rousseff e a orientação da nova ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti.
Ideli reafirmou ontem a disposição do governo de derrubar no Senado a mudança introduzida no projeto pela Câmara, que tira do governo o direito de manter eternamente em segredo documentos públicos classificados como ultrassecretos.
O projeto original, enviado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Congresso há dois anos, reduz de 30 para 25 anos o tempo que papéis ultrassecretos podem ser mantidos em sigilo, mas permite que esse prazo seja renovado indefinidamente.
No ano passado, a Câmara aprovou uma emenda ao projeto, estabelecendo que o sigilo só poderia ser renovado uma vez e limitando a 50 anos o prazo para liberação de documentos oficiais”
A lei que regula esse assunto é a lei 4.553/02, que estabelece quatro graus de sigilo:
- Ultrassecreto: informações referentes à soberania e à integridade territorial nacionais, a planos e operações militares, às relações internacionais do país, a projetos de pesquisa e desenvolvimento científico e tecnológico de interesse da defesa nacional e a programas econômicos, cujo conhecimento não-autorizado possa acarretar dano excepcionalmente grave à segurança da sociedade e do Estado. Prazo máximo: 30 anos, prorrogáveis.
- Secreto: informações referentes a sistemas, instalações, programas, projetos, planos ou operações de interesse da defesa nacional, a assuntos diplomáticos e de inteligência e a planos ou detalhes, programas ou instalações estratégicos, cujo conhecimento não-autorizado possa acarretar dano grave à segurança da sociedade e do Estado. Prazo máximo: 20 anos.
- Confidencial: informações que, no interesse do Poder Executivo e das partes, devam ser de conhecimento restrito e cuja revelação não-autorizada possa frustrar seus objetivos ou acarretar dano à segurança da sociedade e do Estado. Prazo máximo: 10 anos.
- Reservado: informações cuja revelação não-autorizada possa comprometer planos, operações ou objetivos neles previstos ou referidos. Prazo máximo: 5 anos.
Ela também se refere a algo chamado ‘guarda permanente’, que são as informações de valor histórico, probatório e informativo que devam ser definitivamente preservadas. Pode ser aplicado a qualquer um dos casos acima. Não se trata de restrição à informação, mas da preservação física do documento.
Atualmente a lei (art. 7o, parágrafo único) prevê uma única prorrogação. Ou seja, um documento ultrassecreto por 30 anos, pode, ao final dos primeiros 30 anos, ser considerado ultrassecreto por mais 30 anos. Mas até a lei ser alterada em 2004, o prazo máximo dos ultrassecretos era de 50 anos, e prorrogável indefinitivamente, que é o que o governo, de acordo com a matéria acima, quer voltar a fazer.
Mas existe uma outra forma de o governo conseguir prorrogar esses prazos, se o Congresso se opuser à idéia de prorrogação sem prazo. A lei permite a reclassificação dos documentos. Algo que era ultrassecreto pode passar a ser secreto e assim por diante. A lei atual diz que, se ao final do prazo de 30 + 30 anos de ultrassecreto o governo reclassificasse para secreto, não mudaria nada porque o prazo é contado a partir da data da produção do documento. Mas a lei, até 2004, dizia algo diferente: o prazo era contado a partir da reclassificação. Ou seja, se o governo conseguir mudar a data a partir da qual o prazo é contado para o que estava na antiga lei, ao final dos primeiros 60 anos o governo poderia reclassificá-lo como secreto, zerando a conta e dando mais 20 anos, prorrogáveis por mais 20, e depois desses 40 anos, reclassificá-lo como confidencial e, por fim, como reservado. Ou seja, ele ficaria 130 anos fora do alcance público.
Um outro detalhe importante é a definição de 'dano excepcionalmente grave', 'dano grave', 'dano' e 'comprometimento', que diferencia algo ultrassecreto de algo secreto, confidencial e reservado. A lei não faz uma lista do que é considerado excepcionalmente grave. Por isso fica a cabo da autoridade responsável pela classificação – subjetivamente – decidir se algo vai causar um dano excepcionalmente grave ou apenas grave (ou sequer grave) à segurança da sociedade.