Mas antes de acharmos que pessoas mais feias são por natureza mais propensas a cometerem mais crimes (Cesare Lombroso fez escola com esse tipo argumento na segunda metade do século 19 e acabou causando milhares de injustiças), vale a pena ler com cuidado o estudo dessas duas economistas (sim, não são sociólogas, mas economistas). Vale também lembrar, como salienta o estudo, que pessoas pobres não são necessariamente mais belas ou feias do que pessoas ricas. Aliás, como elas apontam, pessoas com o mesmo background socioeconômico, mas com níveis de beleza diferente, tendem a cometer quantidades de crimes diferentes, e isso parece estar correlacionado com seu nível de beleza física.
O argumento das pesquisadoras é que pessoas menos atraentes são levadas a cometer mais crimes por dois motivos:
Primeiro, acabam recebendo salários mais baixos do que as pessoas mais atraentes e usam o crime como uma forma de compensar essa perda financeira pela qual, afinal, não são responsáveis. É o que elas chamam de penalidade do mercado de trabalho. Nessa mesma toada, como já recebem salários mais baixos, o custo de se tornarem criminosas é menor, ou seja, têm menos a perder se forem pegas.
Segundo, pessoas mais atraentes recebem mais atenção de professores na escola (as pesquisadoras focaram o estudo em escolas secundárias), enquanto pessoas menos atraentes recebem menos atenção. Por consequência, pessoas mais atraentes acabam tendo mais e melhor atenção de pessoas responsáveis por sua formação intelectual e, anos depois, quando finalmente chegam ao mercado de trabalho, essa melhor formação intelectual acaba se convertendo em melhores empregos e maiores salários. É o que as pesquisadoras chamam de impacto na formação do capital social dessas pessoas.
O interessante dessa pesquisa é que esses dois tipos de impacto não são frutos de escolhas das pessoas menos atraentes: são fardos que acabam tendo que carregar. O problema desse tipo de pesquisa, contudo, é que, lidas rapidamente, elas são mal interpretadas e acabam gerando ainda mais estigmas. Novamente: o argumento das pesquisadoras não é que as pessoas mais feias cometem mais crimes por serem mais feias, mas são levadas a cometerem mais crimes por causa dos preconceitos que sofrem.
Óbvio que nem toda pessoa pouco atraente vai cometer crime e nem toda pessoa bela está imune à vida criminosa. O que elas demonstraram é que pessoas pouco atraentes acabam cometendo mais crimes do que estatisticamente normal. E isso poderia ser evitado se não tivéssemos tanto preconceito.
Em termos de política de segurança, esse tipo de pesquisa é importante para salientar como algumas de nossas decisões sociais – mesmo que impensadas – acabam gerando consequências, ainda que elas demorem 7 ou 8 anos para virem à superfície, como alegam as pesquisadoras. Fôssemos menos preconceituosos quando educamos ou empregamos, o problema não existiria. É o nosso próprio preconceito que gera nosso problema. Ou como diz Homer Simpson “por que todas as minhas ações têm consequências?”
Em um país formado pela miscigenação, como o Brasil, essa é uma questão crucial. Enquanto inconscientemente beneficiarmos um estereótipo impossível para a grande maioria das pessoas, estaremos condenando essa maioria e, por consequência, a nós mesmos.
Começamos a ver algumas leis tentando coibirem práticas discriminatórias em relação a cor, opção sexual e religião. Mas o problema salientado pelas pesquisadoras vai muito além porque não está ligado à questões facilmente debatidas em um mundo que, na superfície, finge ser politicamente correto: está ligado a fatores como simetria facial, altura, peso, qualidade de pele ou cabelo etc.