“Fux defende validade da Ficha Limpa, mas julgamento é suspenso
Um pedido de vista do ministro Joaquim Barbosa suspendeu nesta quarta-feira o julgamento da Lei da Ficha Limpa no STF (Supremo Tribunal Federal). Antes de o julgamento ser interrompido, o relator, ministro Luiz Fux, manifestou-se parcialmente favorável à aplicação da lei nas próximas eleições, em 2012.
Em seu voto, Fux defendeu que políticos que renunciem a seus mandatos para evitar a cassação possam se candidatar na eleição seguinte. Fora este ponto, toda a lei foi considerada constitucional por Fux. Em longo voto, Fux afirmou que é constitucional praticamente toda a legislação, inclusive a parte da lei que proíbe a candidatura de um político condenado por órgão colegiado (mais de um juiz), mesmo que ainda exista a possibilidade de recurso. Segundo o ministro, esses pontos não ferem o princípio da presunção de inocência. ‘A presunção de inocência, sempre tida como absoluta, pode e deve ser relativizada para fins eleitorais’, afirmou".
Já vimos aqui por que a chamada Lei da Ficha Limpa não foi aplicada nas últimas eleições. Mas a razão para o julgamento atual é diferente. A lei proíbe que quem tiver sido condenado por órgão colegiado do Judiciário concorra às eleições, mesmo que ainda caiba recurso contra a condenação. Quem é contra a aplicação da lei alega que tal proibição ofende o princípio constitucional da presunção de inocência. O ministro na matéria cima, por outro lado, discordou desse argumento. Para entender os argumentos:
A Constituição Federal, no art. 5º, LVII, afirma que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. O STF, em 2008, no julgamento de uma ação com o complicado nome de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 144), disse que a presunção de inocência se aplicava não só para o direito penal, mas para outros ramos do direito, como o eleitoral. Com base nisso, o STF afirmou que somente as decisões irrecorríveis podem tornar alguém inelegível.
O ministro citado na matéria acima disse que a posição do STF na ADPF 144 deve ser mudada. Segundo ele, a mudança é justificada pelo fato de vivermos um período em que já superamos os traumas da ditadura e em que há grande anseio da sociedade pela moralização do exercício dos mandatos do país (ou, em suas próprias palavras, “o acórdão prolatado no julgamento da ADPF 144 reproduziu jurisprudência que, se adequada aos albores da redemocratização, tornou-se um excesso neste momento histórico de instituições politicamente amadurecidas, notadamente no âmbito eleitoral”). Além disso, ele disse que em 1994 foi acrescentado o parágrafo 9o ao art. 14 da CF.
Esse parágrafo (que tem o mesmo valor do resto da Constituição), determinou que o legislador restringisse a elegibilidade com base na vida pregressa do candidato, “desde que direcionadas à moralidade para o exercício do mandato”. Logo, considerar que a parte da Constituição que prevê a presunção de inocência impede a imposição de inelegibilidade a indivíduos condenados criminalmente por decisões recorríveis significa impedir a aplicação de outra parte da Constituição: o art. 14, §9º.
Não é possível prever a posição dos outros 10 ministros, mas o julgamento trará de menos duas questões interessantes à superfície. A primeira é se a presunção de inocência pode impedir a validade da Lei da Ficha Limpa, ou se (como decidiu o ministro) é possível declarar alguém inelegível ainda que ele possa recorrer de sua condenação. A segunda é saber se entre 2008 (quando a ADPF 144 foi julgada) e hoje (véspera de 2012) passou tempo suficiente (e nossa democracia se solidificou o suficiente) para podermos dizer que a interpretação do STF deve ser diferente.