“Advogados retiram apoio de seminário com juiz da Lava Jato
Escritórios de advocacia que defendem empresários investigados pela Operação Lava Jato decidiram que não apoiarão a nova edição do seminário anual do IBCCrim (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais), considerado um dos eventos de maior prestígio do mundo jurídico.
O motivo dos escritórios, que tradicionalmente patrocinam o evento, é a participação do juiz federal Sergio Moro, que conduz os processos da Lava Jato no Paraná, em uma das mesas da 21ª edição do seminário, em agosto.
Quatro advogados confirmaram à Folha que não financiarão o seminário deste ano por causa do convidado.
Entre eles estão José Luis de Oliveira Lima, defensor de Erton da Fonseca, diretor da Galvão Engenharia; Celso Vilardi, advogado de João Auler, presidente do conselho de administração da Camargo Corrêa; e Arnaldo Malheiros, que mantém em sigilo o nome de seu cliente na Lava Jato.
‘Não vou pagar para dar palco a quem viola constantemente o direito de defesa e falará sobre colaborações que sabemos bem como se dão’, afirmou Malheiros, referindo-se à delação premiada, tema da mesa composta por Moro.”
São frequentes reportagens colocando em cheque os motivos para o patrocínio de eventos envolvendo magistrados por empresas com casos sendo julgados por esses mesmos magistrados.
Em princípio, o patrocínio de um evento não deveria ser problema para o patrocinador ou para o patrocinado. Os problemas aparecem quase sempre por causa das regalias envolvidas com o patrocínio e a finalidade do evento.
O patrocínio de um evento no qual os magistrados debaterão novas teorias legais, problemas e soluções para o funcionamento dos fóruns ou qualquer outra questão técnica, são mais fáceis de serem justificados porque os benefícios são da sociedade, ainda que sejam alcançados através dos membros de uma classe. O patrocínio de um evento no qual os magistrados irão beber cerveja, banharem-se ao sol e participarem de encontros sociais o dia inteiro, é muito mais difícil de serem explicados pois o benefício é essencialmente de caráter pessoal para os membros da classe.
Mas a finalidade em si não é o suficiente para tal definição. Mesmo o patrocínio de eventos puramente técnicos pode ser distorcido.
O patrocínio de um evento no qual os magistrados debatem apenas assuntos técnicos, por exemplo, passa a ser questionável se o patrocínio envolve passagens de primeira classe ou em jatos privados a destinos paradisíacos, jantares exorbitantes e outras regalias que não são normais em um evento puramente técnico. Propina não é só dinheiro em envelopes entregues em cantos escuros.
O evento da reportagem acima é essencialmente técnico e na reportagem acima não há qualquer ilação de que palestrantes ou plateia receberão qualquer benefício de caráter pessoal. Logo, soa estranho que as empresas ou escritórios retirem seu patrocínio.
Embora digam que retiraram o patrocínio em protesto contra a participação de um magistrado do qual não gostam esse é um daqueles casos em que entender o motivo pelo qual retiraram o patrocínio importa muito pouco. O importante é que retiraram e isso é a melhor solução para todos, especialmente para a sociedade.
Imagine uma situação contrária: amanhã você abre o jornal e lê na capa que escritórios defendendo os acusados estão patrocinando o evento no qual o magistrado foi convidado a dar uma palestra. Ainda que o patrocínio seja absolutamente ético, pairaria a suspeita sob os motivos do patrocínio. Mancharíamos a reputação dos escritórios, do magistrado, dos organizadores do evento e de seus participantes.
O que os escritórios fizeram na reportagem acima é, na verdade, o melhor a ser feito em casos semelhantes. Se há possibilidade de dúvida sob os motivos de um patrocínio, do ponto de vista ético-legal todos ficam em uma posição muito melhor se uma empresa de cigarros se recusa a financiar um encontro de cientistas que investigam os impactos do fumo, se uma empresa de medicamentos se recusa a financiar um encontro de cientistas que investigam os efeitos de determinada droga, se uma empresa de petróleo se recusa a financiar um encontro de cientistas que debatem o efeito estufa, e se advogados de advocacia se recusam a financiar um evento no qual o magistrado que julga seus clientes é o principal palestrante.
Os motivos da recusa podem ser éticos ou não. Mas isso não importa. O que importa é que ao se recusarem a patrocinar, evitam o problema.