“Enfim, juntos
As revelações do empresário Ricardo Pessoa aos investigadores da Operação Lava Jato deixaram o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, numa posição delicada, em que o seu futuro e o da presidente Dilma Rousseff parecem entrelaçados de forma irreversível.
Pessoa deu R$ 7,5 milhões para a campanha de Dilma no ano passado. Foi tudo declarado à Justiça Eleitoral como a lei manda, mas o depoimento do empreiteiro lançou a suspeita de que dinheiro desviado da Petrobras pode ter sido transferido diretamente para o comitê da presidente.
O empresário diz que só fez a contribuição porque se sentiu ameaçado pelo então tesoureiro da campanha, Edinho Silva, hoje chefe da Secretaria de Comunicação Social do Planalto. Edinho nega ter torcido o braço de Pessoa para conseguir o dinheiro”.
Nossa lei penal estabelece que se alguém força outra pessoa, com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar fazer alguma coisa, isso constitui extorsão, o que é crime. Mas se quem exige a vantagem indevida para si ou para outrem, direta ou indiretamente, o faz em razão de seu cargo de servidor público (ainda que fora da função ou antes de assumi-la), o crime é outro: concussão.
Um outro crime, diferente, é a corrupção passiva, na qual o servidor público aceita ou pede a vantagem indevida. Se a outra pessoa oferece ou paga a propina, ela está cometendo o crime gêmeo da corrupção passiva: a corrupção ativa.
Para quem pagou, é sempre melhor alegar que foi vítima de concussão do que autor de corrupção ativa. Se o servidor público exigiu a vantagem econômica (por exemplo, ‘ou paga ou cancelamos os contratos com o governo’), quem se viu forçado a pagar está sendo vítima de um crime. Logo, não será punido, mas protegido pela lei. Quando se está sob uma coação ilegal, não há opção: ou se paga ou sofre um dano injusto.
Mas se o que houve foi um pedido (por exemplo: ‘se pagar, vamos lembrar de seu nome com carinho na próxima licitação’) e um pagamento por causa desse pedido, ambos cometeram crime. Quem pediu cometeu corrupção passiva, e quem pagou cometeu corrupção ativa.
Logo, para a defesa de quem pagou, é sempre melhor alegar que seu cliente foi obrigado a pagar (em vez de que ofereceu ou aceitou pagar). É a diferença entre ser condenado e sair de cabeça erguida pela porta da frente. Por isso mesmo bons magistrados sempre tomam muito cuidado com alegações de que quem pagou o fez porque o servidor público usou de seu cargo para exigir o pagamento.
Mas há algo ainda mais interessante aqui: do ponto de vista do servidor público que decide confessar, é também melhor que ele alegue que exigiu em vez de apenas pedir ou aceitar. Embora na concussão o servidor público use de seu cargo para coagir a vítima, a pena varia de dois a oito anos. Mas se ele ‘apenas’ pede ou aceita a propina (corrupção passiva), a pena contra o servidor público é muito maior: de dois a doze anos, e pode ainda ser aumentada em até um terço (ou seja, passa a ser de três a 16 anos) se, em consequência da vantagem ou promessa, o servidor de fato retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional. Isso ocorre porque em 2003 o legislador aumentou a pena da corrupção passiva, mas se esqueceu de aumentar a da concussão.