“Peço a Dilma que ao menos tente me salvar, diz condenado à morte
Sob ameaça de ser fuzilado na Indonésia em breve, Marco Archer Cardoso Moreira, 50, diz ter esperança de que a presidente Dilma Rousseff consiga evitar a sua morte.
‘Peço para ela ao menos tentar’, disse, na madrugada de ontem, por telefone, em entrevista exclusiva à Folha. ‘A única pessoa que pode me salvar é ela.’
Preso em 2003 ao tentar entrar na Indonésia com 13,4 kg de cocaína, Archer foi condenado à morte em 2004 - e já perdeu todos os recursos na Justiça (...)
Na semana passada, um procurador disse ao ‘The Jakarta Post’ que ele será executado nas próximas semanas, o que sinaliza que o presidente da Indonésia, Susilo Bambang Yudhoyono, rejeitou o pedido de perdão - sua última chance de escapar (…)
Você sabe como é a execução?
Houve dois nigerianos aqui que foram executados [em 2008, os dois últimos a morrer na Indonésia].
E como foi?
O comandante da prisão veio e falou para eles que tinha uma visita. Quando eles foram até os policiais, agarraram eles e levaram para fuzilar.
Um deles tentou fugir, mas não adiantou. Aí, à noite, eles foram executados”
Quando entramos no território de um outro país, aceitamos as leis daquele país. Não importa que entremos como turistas, como refugiados, como trabalhadores ou mesmo apenas por alguns minutos para fazer conexão entre dois vôos. Enquanto estamos dentro do país, estamos sujeitos às suas leis. Isso é um princípio básico da soberania nacional.
Logo, se alguém resolve traficar drogas em um país onde a pena de morte pode ser imposta ao traficante, ele está assumindo o risco de ser condenado à morte. Não importa que ele desconhecesse a lei local (não podemos alegar desconhecer a lei para tentar escapar dela), ou se ninguém é condenado daquela forma há anos. O fato de uma lei não ser usada não quer dizer que ela deixou de valer. Uma lei deixa de valer quando outra norma a revoga. Nunca pelo desuso. Por exemplo, o Brasil também tem pena de morte por fuzilamento em tempo de guerra. O fato de ninguém ter sido condenado ao fuzilamento há décadas no país não quer dizer que essa punição deixou de existir.
Pois bem, o condenado na matéria acima diz que só a presidente brasileira pode ajudá-lo. Não é bem assim. A única pessoa que pode de fato agraciá-lo é o presidente do país que o condenou. Se ele houvesse sido condenado no Brasil, a presidente de fato poderia conceder graça, que é um poder que só ela tem no Brasil. Conceder graça significa ordenar que a pena seja – total ou parcialmente – modificada ou deixe de existir. É uma das formas de controle entre os três poderes. No caso, do Executivo sobre o Judiciário.
Sem fazer um juízo de valor sobre a pena de morte ou essa condenação em específico, a presidente pode tentar ajudá-lo no sentido político, tentando persuadir o presidente da Indonésia a exercer seu poder de graça. Isso pode ser feito politica, econômica ou militarmente. Mas não juridicamente, que é o que de fato importa.
Mas os presidentes raramente tentam exercer tal poder quando o crime é grave e o criminoso é confesso e foi julgado por uma corte independente, de acordo com as leis democráticas daquele país. Por quatro razões:
Primeiro, porque quem pede um favor passa a dever vários favores. Se ela intercede por ele e o governo local atende seu pedido, em algum momento a Indonésia pedirá um ou mais favores tão ou mais constrangedores ao governo brasileiro. E, obviamente, ninguém quer ficar devendo favor que pode causar constrangimento no futuro.
Segundo, porque nenhum país quer interceder nos assuntos internos de outro país, da mesma forma como ele não quer que outros países intercedam em assuntos internos brasileiros. Especialmente se os governos de ambos são democráticos. É como se questionasse a legitimidade do governo, das leis locais e da sociedade local. Imagine como você se sentiria se a imprensa brasileira publicasse que o governo desse ou daquele país está pressionando o Brasil a aplicar suas leis de forma a beneficiar um estrangeiro que cometeu um crime no Brasil.
Terceiro, porque mesmo que ela interceda, não há nenhuma razão para que o presidente do outro país atenda sua solicitação. Em outras palavras, ela vem a público fazer um pedido e o outro presidente a ignora. Isso enfraquece sua imagem não apenas internacionalmente, mas também internamente. Ela perde força política, e força política é tudo que um presidente tem.
Por fim, ela sabe que é muito improvável que o presidente do outro país atenda seu pedido. Não só porque ele se indisporia contra o Judiciário local, mas porque as penas são impostas não apenas para punir o criminoso, mas também para servir de exemplo a outros potenciais criminosos. Algo como ‘olha o que pode acontecer com você se você cometer um crime’. Se ele agracia o condenado estrangeiro, duas coisas acontecem: primeiro, ele acaba com o caráter exemplificativo da pena: potenciais criminosos sabem que a pena é possível, mas é improvável. Segundo, ele se coloca em uma saia justa interna: por que ele trata criminosos estrangeiros de forma mais benéfica do que criminosos locais? Além disso, estrangeiros não votam nas eleições daquele país. São os cidadãos locais, que agora se sentem discriminados por seu próprio presidente, que votam.