“Câmara aprova a criação do Dia do Orgulho Hétero
A Câmara de São Paulo aprovou ontem projeto do vereador Carlos Apolinario (DEM) que cria o Dia do Orgulho Heterossexual, no terceiro domingo de dezembro.
Para entrar no calendário oficial, o projeto tem de ser sancionado pelo prefeito Gilberto Kassab (PSD). A cidade não tem Dia do Orgulho Gay.
Segundo Apolinario, que é evangélico, a data visa ‘conscientizar e estimular a população a resguardar a moral e os bons costumes’.
A votação foi simbólica, ou seja, quem fosse contrário teria que se manifestar. Dos 50 vereadores que registraram presença, 19 ficaram contra.
Ítalo Cardoso (PT) exibiu reportagem sobre a agressão a pai e filho que, abraçados, foram confundidos com gays em São João da Boa Vista. ‘Amar os iguais é fácil. Difícil é amar os diferentes’, disse (…)
Pedro Estevam Serrano, professor de direito constitucional da PUC-SP, diz que, embora legal, o projeto tem de ser vetado porque contém uma ‘atitude beligerante’”.
Essa matéria é interessante para entendermos o veto:
O veto é uma das formas de controle de um poder sobre o outro. No caso, do Executivo sobre o Legislativo. O Legislativo aprova o projeto de lei, mas o Executivo pode vetá-lo (e depois, em uma forma de contra-controle, o Legislativo pode derrubar o veto).
Reparem que o advogado consultado na matéria diz que a matéria é legal mas que o projeto precisa ser vetado porque ele contém uma atitude beligerante.
Na verdade, uma atitude beligerante (ou pacífica) não é critério para vetar um projeto de lei. Nem na esfera federal nem na estadual. Olhem o que o artigo 66 e o artigo 28 das constituições federal e estadual, respectivamente, dizem:
- “Art. 66 §1º - Se o Presidente da República considerar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao interesse público, vetá-lo-á total ou parcialmente, no prazo de quinze dias úteis, contados da data do recebimento, e comunicará, dentro de quarenta e oito horas, ao Presidente do Senado Federal os motivos do veto”
- “Art. 28 §1º - Se o Governador julgar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao interesse público, veta-lo-á, total ou parcialmente, dentro de quinze dias úteis, contados da data do recebimento, comunicando, dentro de quarenta e oito horas, ao Presidente da Assembléia Legislativa, o motivo do veto”
Inconstitucionalidade é um critério objetivo: ou o projeto vai contra a Constituição ou não vai. Se for, precisa ser vetada porque a Constituição nunca pode ser desrespeitada. Um projeto ser ilegal não é motivo para que ele seja vetado: ilegalidade é quando ele vai contra uma outra lei, não quando ele vai contra a Constituição. Constituição não é lei: é uma norma que está acima das leis. Logo, se o projeto é apenas ilegal, ele pode ser sancionado (na prática, isso ocorre todos os dias. É assim que as leis antigas deixam de valer).
Já o interesse público é um critério subjetivo. Cabe ao presidente/governador decidir o que é interesse público. E, em teoria, ninguém sabe mais sobre o interesse público do que o presidente/governador, afinal ele foi eleito por representar os interesses de dezenas de milhões de eleitores. O que ele disser que é de interesse público, será de interesse público, e o contrário também é válido: o que ele disser que não é de interesse público, não será de interesse público. Não dá para discutir porque, afinal, nem eu nem você carregamos o peso de milhões de votos. Por isso, se o governador decidir que o projeto de lei acima pode levar à discriminação e isso não é de interesse público, ele irá vetá-lo. Se ele decidir que o projeto é apenas uma forma de liberdade de expressão, ele irá sancioná-lo. Isso fica a critério dele.
PS: A palavra ‘beligerante’ na entrevista foi usada de forma não-técnica. Do ponto de vista técnico, um ato beligerante (um ato de guerra) é de competência exclusiva da União (art. 21, II, de nossa Constituição Federal). Isso é para evitar que um estado coloque o país inteiro em uma guerra. Por isso só a União pode declarar guerra contra outro país.