“Três dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal se manifestaram ontem a favor das pesquisas com embriões humanos, mas o julgamento, um dos mais esperados da história do tribunal, foi adiado por um pedido de vista de Carlos Alberto Menezes Direito.
O STF começou a apreciar a ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo ex-procurador-geral da República Claudio Fonteles contra o artigo da Lei de Biossegurança, de 2005, que liberou essa linha de pesquisa. O julgamento, que opõe Igreja Católica a cientistas, durou cerca de cinco horas.”
Texto interessante para refletir sobre a convivência entre religião e leis.
Do ponto de vista cultural, uma das maiores mudanças das sociedades ocidentais nos últimos 150 anos foi a secularização do Estado. De outro lado, a maioria dos países de maioria muçulmana passou por um processo contrário: um movimento em direção à 'fundamentalização' (as leis religiosas dirigindo as sociedades e leis “terrenas”).
O Brasil, de uma forma ou de outra, foi influenciado pela onda de secularização, mas não totalmente. E vez por outra temos esses choques entre religiosos e secularistas no âmbito jurídico. Se olharmos os preâmbulos de nossas Constituições, veremos que quase todas invocam Deus como seu garantidor (as duas exceções são as constituições de 1937 e 1891):
- “Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus(...)” (Constituição de 1988)
- “O Congresso Nacional, invocando a proteção de Deus, decreta e promulga a seguinte Constituição do Brasil” (Constituição de 1967)
- “Nós, os representantes do povo brasileiro, reunidos, sob a proteção de Deus, em Assembléia Constituinte para organizar um regime democrático, decretamos e promulgamos a seguinte Constituição dos Estados Unidos do Brasil” (Constituição de 1946)
- “Nós, os representantes do povo brasileiro, pondo a nossa confiança em Deus, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para organizar um regime democrático, que assegure à Nação a unidade, a liberdade, a justiça e o bem-estar social e econômico, decretamos e promulgamos a seguinte Constituição da Republica dos Estados Unidos do Brasil” (Constituição de 1934)
A cada 20 ou 30 anos o Brasil passa por esses momentos de “teste” para saber o quanto queremos nos secularizar. Na constituinte de 1988, venceu a religião, com a permanência da referencia a Deus (houve um grande debate na época). No fim da década de 1977, venceu a secularização, com a Lei do Divórcio (até o advento da Lei do Divórcio, em 1977, o casamento era para sempre). O debate atual no STF é importante não apenas para o debate das células-tronco, mas para definir o quanto a sociedade brasileira deseja mudar, e em qual direção.