“Justiça manda ex-juiz Nicolau, 84, de volta à prisão em regime fechado
O ex-juiz Nicolau dos Santos Neto, 84, foi levado na noite de ontem para a carceragem da Polícia Federal em São Paulo após decisão do TRF (Tribunal Regional Federal) da 3ª Região, que revogou sua prisão domiciliar.
A decisão de reconduzi-lo ao regime fechado de prisão foi tomada na semana passada, mas só divulgada ontem.
Nicolau chegou a ser encaminhado na última sexta à carceragem da PF na Lapa, zona oeste paulistana, onde ficou durante cinco horas. Ele acabou liberado por determinação de uma juíza federal.
A magistrada considerou que não havia condições adequadas para recebê-lo - devido à falta de médico de plantão e sala especial a que teria direito, por ter curso superior (…)
O ex-juiz estava preso em sua casa no Morumbi, zona sul de São Paulo, desde 2007.
No ano anterior, ele foi condenado a 26 anos de prisão. A Justiça concluiu que Nicolau foi responsável pelo desvio de R$ 169,5 milhões durante a construção do Fórum Trabalhista de São Paulo.
Entre as razões para revogar a prisão domicilar, Stefanini afirma que o estado de saúde de Nicolau não é tão grave (…)
Stefanini afirma ainda que o fato de Nicolau ter 84 anos não garante automaticamente a prisão domiciliar (...)
O advogado diz que, por ele ter mais de 80 anos, a prisão domiciliar é um direito”.
No Brasil, a prisão domiciliar pode ocorrer em dois momentos distintos. Uma ocorre antes da condenação e a outra depois.
A prisão domiciliar que ocorre antes da condenação é uma das medidas cautelares alternativas à prisão preventiva que um magistrado pode decretar. Em bom português, em vez de manter o suspeito em uma cadeia enquanto não se tem certeza de sua culpa, ele fica preso em casa.
Para ele ter direito à prisão domiciliar, é necessário que ele caia em uma dessas condições:
- Ser maior de 80 anos;
- Estar extremamente debilitado por alguma doença grave;
- Que sua presença seja imprescindível aos cuidados especiais de uma criança menor de 6 anos ou de uma pessoa que sofra de alguma deficiência;
- No caso de mulher, for gestante a partir do 7o mês de gravidez ou sua gravidez for de alto risco.
Já a prisão domiciliar que ocorre depois da condenação ocorre quando o condenado está cumprindo pena em regime aberto e se encontre em uma das seguintes situações:
- Tem mais de 70 anos; ou
- Se for mulher, está grávida, ou possui filho menor ou deficiente; ou
- Se for homem, for viúvo e tem filho menor ou deficiente; ou
- Estiver acometido de doença grave.
Mas note – e isso é importante – que apenas o condenado que está em regime aberto tem direito a essa prisão domiciliar.
Mas, então, em qual prisão domiciliar estava o ex-juiz?
Até que a decisão seja divulgada, não dá para ter certeza. Mas dá para presumir:
A matéria diz que a decisão o obriga a voltar ao regime fechado e que ele foi condenado a 26 anos de prisão. Então só pode ter sido a que ocorre depois da condenação, certo?
Não. O fato de haver condenação não quer dizer que é fim de assunto: pode haver recurso. Se a defesa ainda está recorrendo – ou seja, a condenação não transitou em julgado – é possível que o réu esteja na prisão domiciliar pré-condenação. Já se sabe o tamanho da pena (26 anos) e o regime de cumprimento inicial da pena (fechado), mas isso não quer dizer que o assunto esteja encerrado: até que não caiba mais recurso (e se a lei não disser o contrário) o preso ainda pode beneficiar-se das medidas cautelares utilizadas antes do julgamento para mantê-lo fora da prisão.
É por isso que tanto advogado quando magistrado bateram na tecla dos 80 anos (note que, depois da condenação, a idade é 70 anos). E note que se fosse a prisão domiciliar pós-condenação o réu da matéria acima não poderia beneficiar-se dela, já que ele ainda não teria direito ao regime aberto.
E por que o advogado diz que o réu tem direito à prisão domiciliar e o juiz do caso diz que não?
Porque a lei foi mal escrita.
Os incisos do art. 318 do Código de Processo Penal não usam nem a conjunção ‘ou’ nem conjunção ‘e’. Logo, não se sabe ao certo se o legislador queria dizer que todas as condições eram necessárias ou apenas um delas. A maior parte dos juristas entende que basta uma (afinal, seria impossível alguém ter mais de 80 anos e estar grávida ao mesmo tempo). Mas isso não é consenso, como mostra a decisão do magistrado que mandou o ex-juiz de volta para a prisão.