“O subprocurador do Ministério Público Federal Eduardo Antônio Dantas Nobre emitiu parecer favorável à anulação da ação penal em que o banqueiro Daniel Dantas foi condenado a dez anos de prisão sob a acusação de subornar policiais que participaram da Operação Satiagraha da Polícia Federal.
Em um parecer sucinto, o subprocurador aponta que a atuação de agentes da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) nas investigações da Satiagraha foi ilegal e por isso a ação criminal contra Dantas deve ser anulada desde o seu início.
Caso os ministros do STJ (Superior Tribunal de Justiça) sigam o entendimento do subprocurador, a ação poderá ser considerada nula e a decisão poderá ter efeitos nos outros processos relativos aos supostos crimes cometidos por Dantas e executivos do grupo Opportunity.
A manifestação de Nobre contraria a posição adotada anteriormente por outros membros do Ministério Público Federal em relação à legalidade da participação da Abin na operação da PF.
Nobre emitiu o parecer em uma ação de habeas corpus protocolada pela defesa do banqueiro no STJ. Nesse tipo de causa, a Procuradoria opina na condição de fiscal da correta aplicação da lei.
Os ministros do tribunal que vão julgar o habeas corpus não são obrigados a seguir o entendimento do subprocurador, mas a manifestação dele certamente será usada pelos advogados de Dantas para tentar convencer os julgadores.
De acordo com o parecer de Nobre, houve ilegalidade na investigação pois a participação dos agentes da Abin teria sido às escondidas, com o objetivo de ‘propiciar a prática, por eles, de atos reservados a agentes policiais, a exemplo da manipulação e análise de diálogos captados por eficiência de interceptações telefônicas’.
O subprocurador valeu-se da prerrogativa da autonomia funcional para contrariar posicionamentos de outros membros do Ministério Público sobre a questão.
No final do ano passado, a 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, órgão consultivo da Procuradoria na área penal e de controle externo da polícia, analisou um inquérito relativo à participação dos servidores da Abin na operação da PF.
A câmara de revisão, constituída por três subprocuradores da República, decidiu que a atuação dos agentes da Abin na operação ocorreu de forma auxiliar e secundária, sob a supervisão da PF, e por isso dentro da legalidade”.
A autonomia funcional é uma prerrogativa da instituição e não do ocupante do cargo dentro da instituição. Se olharmos o art 127 da Constituição, onde ela é mencionada, ele diz que “§ 2º Ao Ministério Público é assegurada autonomia funcional e administrativa”. Reparem que aqui a lei está falando da instituição e não de seus servidores. A idéia é reforçada no art. 4º da Lei Complementar 75, que trata do Ministério Público. Diz ele que “são princípios institucionais do Ministério Público da União a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional”. Reparem que ela diz claro que são princípios da instituição e não direitos do ocupante de cargos dentro da instituição.
A Constituição só fala dos membros do Ministério Público no artigo 128, I, quando lista suas garantias: “§ 5º - Leis complementares da União e dos Estados (…) estabelecerão a organização, as atribuições e o estatuto de cada Ministério Público, observadas, relativamente a seus membros: I - as seguintes garantias: a) vitaliciedade(…), b) inamovibilidade (…), c) irredutibilidade de subsídio”.
A autonomia funcional não serve para o procurador fazer o que bem quiser, mas para que o Ministério Público – cuja a função é defender a lei – possa agir sem precisar pedir permissão ao presidente da República (ou governador, no caso do Ministério Público Estadual). Isso porque ele está subordinado àquele poder (o Ministério Público é o que chamamos de órgão apêndice do poder Executivo). Se o Ministério Público não tivesse a autonomia funcional ele ficaria impossibilitado de exercer suas funções já que boa parte das ações que ele move são contra o próprio poder Executivo, quando suspeita que este possa ter desrespeitado a lei. Embora protegido contra a interferência do chefe do poder executivo (federal ou estadual), o membro do Ministério Público continua obrigado a agir dentro do que tanto a Constituição quanto as leis abaixo dela prevêem e permitem.