É apenas mais uma manifestação da Femen, o movimento nascido na Ucrânia e que se espalhou pelo mundo, inclusive no Brasil, que se especializou no uso do corpo feminino como instrumento de protesto. Prato cheio para fotógrafos. Audiência fácil para veículos de comunicação.
Talvez protestem a favor do aborto na Irlanda, pela proteção das florestas no Brasil, contra o arrocho salarial na Grécia, ou o ditador na Belarússia. Alguém se lembra contra o que protestam?
Alguém se lembra contra o que protestam?
Notam-se os seios impúberes, as expressões de dor. Mas notamos as causas?
O debate entre forma e conteúdo é importante em um momento em que protestos se espalham pelo mundo, e se aplica igualmente aos protestos mudos na Turquia, armados no Oriente Médio ou que param o trânsito no Brasil.
Para uns, sua nudez é apenas uma alegoria carnavalesca: um fim em si. O tema é uma desculpa entre as muitas possíveis. Desviam a atenção de assuntos que precisam ser debatidos, enfraquecem a causa, minguam o debate. Pior, objetificam o corpo feminino que pretendem defender, da mesma forma que as manifestações contra a condição do transporte público no Brasil pioram ainda mais o trânsito.
Evidenciaria a dicotomia entre forma e conteúdo na sociedade moderna: aquilo que chama a atenção carece de conteúdo para sustentar o debate racional; mas o argumento racional necessário ao debate construtivo carece de atenção para ser debatido.
Seria simplista dizer que são protestos vazios, contudo. Você pode não se lembrar do conteúdo, mas terá prestado atenção na imagem da moça nua na Ucrânia, de São Paulo parada, da moça de vermelho na Turquia, e do jovem na frente dos tanques na praça da Paz Celestial. Em um mundo bombardeado de distrações e na qual a atenção é cada vez mais escassa, você terá notado aquele protesto. Não porque tinha particular interesse naquilo sobre o que se protestava, mas porque a forma do protesto chamou sua atenção.
Se as integrantes do Femen tivessem protestado vestidas, teriam suas fotografias espalhadas pelo mundo? E se o manifestantes brasileiros tivessem enviado um abaixo-assinado aos congressistas?
Provavelmente não.
O problema, contudo, permanece sem resposta nas democracias modernas: a partir de que ponto a forma deixa de ser mero instrumento para externar o conteúdo e torna-se um fim em si? E, pior, quando é que ela passa a atrapalhar o diálogo sobre o conteúdo?