"Empate favorece réu, diz presidente do STF
Sete réus do mensalão devem ser absolvidos hoje pelo STF (Supremo Tribunal Federal) de alguns dos crimes pelos quais são acusados.
O julgamento em relação a eles acabou empatado e, ontem, o presidente do Supremo, Carlos Ayres Britto, disse entender que o empate favorece o réu.
'A unidade dele [do tribunal] somente se obtém com a maioria dos votos. Se a maioria não foi obtida, essa unidade não se perfez, ficou a meio caminho. É por isso que o empate opera a favor do réu', afirmou Britto, dizendo-se aberto para considerações dos colegas.
Essa linha é confirmada por outros ministros. O princípio que sustenta essa avaliação é que, na dúvida, predomina a posição mais benéfica ao réu já que está em análise uma eventual possibilidade de prisão. Esse modelo é adotado no Supremo em discussões de habeas corpus.
Para Marco Aurélio Mello, no entanto, os empates devem ser definidos com o voto do presidente do STF"
Já dissemos aqui que o Mensalão, do ponto de vista jurídico, é monótono; ainda que seja pura adrenalina do ponto de vista político. Hoje começa o que será possivelmente a única parte realmente interessante do julgamento do ponto de vista jurídico, porque o STF terá que decidir que regra usar para apenar.
Até agora ele condenou e absolveu, ele não apenou. A partir de agora ele terá que dizer quais as regras serão aplicadas às três batatas quentes em seu colo:
Primeiro, ele precisa determinar se e como quem absolveu pode apenar quem foi condenado. Isso porque a maior parte das condenações ocorrerou não por unanimidade, mas por maioria de votos.
Quem disse que o acusado era inocente agora pode (e deve) proferir um voto dizendo a quanto condená-lo?
A questão é importante porque se o magistrado que votou por absolver agora puder dizer a quanto ele deve ser condenado, as condenações, obviamente, tenderão ao mínimo (baixas o suficientes para os condenados não irem parar na prisão).
E aí entra a segunda parte interessante do julgamento: que regra usar para determinar a pena? Com raras exceções, os magistrados que condenaram, o fizeram por motivos ou baseados em argumentos diferentes. Se fossem por motivos idênticos, seus votos se resumiriam a dizer que acompanhavam o relator. Isso se faz em 30 segundos e não em horas ou dias, como aconteceu. Às vezes, condenaram baseados até em fatos diferentes.
Culpa é binomial: sim ou não; condenado ou absolvido. Apenação, por outro lado, é discreto e subjetivo: pode ser qualquer valor entre o mínimo e o máximo, baseado na interpretação que o magistrado teve dos fatos e circunstâncias do crime, das agravantes e atenuantes, das causas de aumento e diminuição da pena, e da interpretação da lei em si. Um magistrado pode determinar uma pena justa de dois anos e outro de 20. Qual prevalecerá?
A decisão sobre qual pena será aplicada a cada condenado é, em si, monótona para os juristas. Mas a decisão sobre que regras o STF utilizará para determinar penas diferentes entre os dez ministros envolvidos no Mensalão será muito interessante e poderá ter repercussões importantes em centenas de milhares de processos que correm em tribunais superiores e inferiores, onde as decisões também são tomadas por colegiados.
A última questão juridicamente interessante é o que fazer em caso de empates entre votos pela condenação e pela absolvição. O único outro caso com tamanha repercussão na história recente do país que foi julgado pelo STF e acabou em empate – a aplicação da Lei da Ficha Limpa – foi decidido com base em uma regra cuja aplicação é impossível no Mensalão: em caso de empate, permanece a decisão da instância inferior (no caso, do TSE). Mas o Mensalão está sendo decidido em instância única por conta do foro privilegiado. Não há uma decisão de instância inferior a ser respeitada.
As três opções na mesa do STF são o voto de Minerva do presidente (e, nesse caso, qual presidente teria o voto de Minerva?); o in dubio pro reo (em caso de dúvida, decide-se da forma mais favorável ao réu); ou esperar que o novo ministro recém indicado ao Tribunal e que não esteve envolvido com o julgamento até agora, profira o voto decisor. Qualquer que seja a decisão, ela provavelmente será empregada em outros milhares de casos em tribunais inferiores.