“Ministro do STF cancela festa que seria paga por advogado
O ministro Luiz Fux, do STF (Supremo Tribunal Federal), pediu ontem ao advogado Sérgio Bermudes que ele cancelasse o jantar que estava preparando para o magistrado.
A festa, que ocorreria no dia 26 no apartamento de 800 metros quadrados do advogado, na zona sul do Rio, estava preparada para reunir políticos e a cúpula do judiciário nacional e do Estado.
O evento celebraria os 60 anos de Fux (...)
A divulgação do jantar pela Folha causou constrangimento no Supremo. Nos bastidores, ministros criticaram a festa, para a qual foram disparados 300 convites.
Além de ser bancada pelo advogado, ela ocorreria pouco após o presidente da Corte, Joaquim Barbosa, ter criticado o que considera 'conluio' entre juízes e advogados.”
A matéria faz referência à questão da amizade (ou inimizade) entre advogados e magistrados como motivo de impedimento ou suspeição deste para o julgamento das causas em que aquele advogado atua.
O Código de Processo Civil brasileiro não trata expressamente dessa situação.
Ele diz que o magistrado está impedido de julgar se um parente seu for advogado de uma das partes (art 134, IV) ou deve declarar-se suspeito se ele for “amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer das partes” (art. 135, I).
Em outras palavras, para gerar o impedimento do magistrado, o legislador brasileiro considerou necessário que o advogado atuando na causa seja seu cônjuge ou parente próximos (pai, avô, filho, neto ou irmão).
Quanto à amizade ou inimizade como motivo de suspeição da parcialidade do magistrado, o Código somente aponta aquela existente entre magistrado e a própria parte do processo (autor ou réu), nada dizendo em relação aos advogados que nele atuam.
É óbvio que no mundo jurídico, como em qualquer outra esfera da vida, há relações de amizades e inimizades entre magistrados, membros do Ministério Público e advogados, e seria impossível proibir magistrados de julgarem causas em que seus conhecidos atuem. Afinal, se um advogado atua por alguns anos em uma cidade ele, necessariamente, acabará conhecendo alguns magistrados, se não todos. E acabarão se encontrando em seminários, festas etc.
O problema, contudo, é quando há uma relação que vai além do mero convívio social, como o pagamento de uma festa ou de passagens aéreas para ir ao casamento do advogado.
Na Itália, por exemplo, de onde copiamos boa parte de nosso Código de Processo Civil, o art. 51 diz que “Il giudice ha l’obbligo di astenersi (…) 2) se egli stesso o la moglie e’ parente fino al quarto grado o legato da vincoli di affiliazione, o e’ convivente o commensale abituale di una delle parti o di alcuno dei difensori; 3) se egli stesso o la moglie ha causa pendente o grave inamicizia o rapporti di credito o debito con una delle parti o alcuno dei suoi difensori” (algo como "o juiz está obrigado a abster-se se ele ou sua mulher é parente até o quarto grau ou ligado por vínculo de filiação, ou é convivente ou comensal habitual de uma das partes ou de algum dos defensores ou 3) ele ou sua mulher litiga ou tem inimizade ou relação de crédito ou débito com uma das partes ou com algum dos defensores").
O código italiano trata a relação do magistrado com os advogados das partes da mesma forma como trata a relação com as partes em si. No caso brasileiro, essa equiparação existe no caso de relações objetivas – como parentesco – mas não nas subjetivas – como a amizade.
O Código de Processo Civil brasileiro, no parágrafo único do art. 135, prevê a possibilidade de “poderá ainda o juiz declarar-se suspeito por motivo íntimo”.
Mas note que aqui é uma faculdade – “poderá” – e não uma obrigação. E mais: fica a critério único do magistrado ponderar se sua relação de amizade ou inimizade com o advogado pode vir a influir em sua imparcialidade na causa.
Por isso, não se pode saber ao certo se o magistrado considera o fato de frequentar festas na casa de um advogado motivo íntimo suficiente para considerar-se suspeito de julgar as causas em que este defensor atua. Do ponto de vista jurídico, a lei não proíbe.
PS: Há, contudo, alguns juristas no Brasil que dizem que o magistrado deve declarar-se suspeito por sua relação de amizade com o advogado porque, no processo, o advogado é equiparado à parte em si. Contudo, a maioria dos juristas que discordam desse posicionamento apontam para o fato de que o advogado representa o cliente; ele não é o cliente.